Palestrantes abordam o tema sob as perspectivas da natureza e seus processos, a interação entre o homem e a natureza e os riscos e responsabilidades jurídicos inerentes
Na última quarta-feira (28), a Academia Nacional de Seguros e Previdência (ANSP) realizou uma palestra com o tema “Gestão de Riscos e os eventos climáticos do Litoral Norte”, em mais uma edição do Café com Seguro. A abertura da live ficou por conta do vice-presidente da ANSP, Ac. Paulo Marraccini. O evento também teve a participação do coordenador da Cátedra de Gerência de Riscos, Ac. Marcos Lúcio de Moura e Souza, que contextualizou o tema, além do Ac. Jorge Eduardo de Souza, Ac. Giovanni Cezimbra Balen e do Ac. Pedro Guilherme Gonçalves de Souza, coordenador da Cátedra de Contrato do Seguro, como debatedores.
A live, que é uma realização conjunta das Cátedras de Gerência de Riscos e de Contrato do Seguro, teve como objetivo promover o debate e uma avaliação dos acontecimentos catastróficos ocorridos no litoral norte de São Paulo sob as perspectivas da natureza e seus processos, a interação entre o homem e a natureza e os Riscos e Responsabilidades Inerentes. Visou a mostrar como os eventos ratificam e, em que medida, o acerto da iniciativa governamental em incluir gerência de riscos na administração pública.
Em suas considerações iniciais, Ac. Marraccini destacou que tivemos, em fevereiro, um evento muito dramático, em que várias residências foram atingidas e veículos foram submersos. “A meu ver, o que caracterizou essas últimas tempestades é que se construiu muito nas encostas. E o mesmo ocorreu no Litoral Norte. Nos 40 anos que eu estou lá eu já presenciei algumas inundações, mas nenhuma com tamanha dramaticidade como a que ocorreu agora”, afirmou.
O Ac. Marcos Lúcio falou sobre impactos desses desastres e o estado contínuo de alerta/pânico das pessoas que moram nessas áreas. “E o pior de tudo é a tendência natural do recrudescimento dessas ocorrências, com o aumento da frequência e da intensidade. Não há orçamento público que resista a esses impactos”, disse. Para ele, é evidente que se fazem necessárias ações inteligentes que mudem as condições desse enfrentamento. E essas ações inteligentes são aquelas trazidas pela Gestão de Risco.
A natureza e seus processos
O Ac. Jorge Eduardo de Souza trouxe a discussão a origem desses fatores climáticos que são cíclicos, históricos e já muito conhecidos. “O que devemos analisar é quais deles são mais prováveis na minha ação, no meu projeto, no meu local e na minha vida, e que danos podem me causar. É importante ter a percepção dos riscos que me envolvem e me preparar para administrá-los”, indicou.
Em sua palestra, o executivo também elencou alguns riscos que ele julga importantes, tais como o risco climático na agricultura (chuvas, secas, ventos, geadas, chuvas de granizo e variação de temperatura) e reforçou que a prevenção é essencial para minimizar o potencial de danos e salvar vidas.
No que diz respeito a inundação, o executivo afirma que é a coisa mais natural do mundo, uma vez que nós ocupamos as margens dos rios e eles se expandem com as chuvas, com o degelo das cordilheiras. Sobre os incêndios florestais, o palestrante explicou que existem queimadas que são decorrência de processos naturais de autopurificação de matas e do solo e que, analogamente, podem ser utilizadas como técnica até mesmo na agricultura moderna. É um processo controlado, que auxilia no combate as pragas e minimiza custos. É uma prática inteligente, mas que também deve ser cuidadosa. O incêndio de uma floresta, natural ou provocado, acontece para purificá-la, para evitar que os parasitas que vivem das seivas nas grandes matas destruam as árvores.
Quanto a queda de barreiras, elas ocorrem frequentemente no Brasil, devido a metodologia que utilizamos no para fazer um corte numa colina. “Você corta no pé, que é onde vai passar, onde aparece a cava. Corta-se e ela fica sem pé. É como se fosse um ser humano com pé sem dedos em um ambiente de declive. Perde a aderência e a capacidade de suportar o peso de acréscimo de água. E esses morros, essas colinas, vira e mexe caem, se deslocam. Além disso, há um movimento natural nas florestas, que ocorre sem a intervenção do homem. É um processo natural de saturação aquática, de volume de água. Na Europa, que é repleta de países cheios de rodovias, que cortam até colinas e montanhas, praticamente não se vê acidentes, quedas de barreiras e mortes. Isso porque, lá o valor a vida é fundamental. Antes de fazer uma rodovia se pensa em todas essas possibilidades”, destacou.
A interação entre o homem e a natureza
O Ac. Giovanni Balen explanou sobre a intervenção do homem na natureza, com relação aos eventos catastróficos, mais especificamente no que aconteceu no litoral norte de São Paulo, que afeta também litoral sul do Rio de Janeiro e outras praças do nosso país. Em sua apresentação, o palestrante abordou tópicos como a interferência, consequências, assim como a história da ocupação dos morros, a construção da Rodovia Rio Santos e a ocupação de terrenos inapropriados e ainda os alagamentos. “Esse aumento dos desastres naturais, dentre outros fatores, tem uma relação muito grande com essa intensificação na mudança climática, com o aumento da temperatura do nosso planeta”, explicou.
Falando um pouquinho da interferência humana do homem na natureza que gera todos esses fatores adversos ou intensifica esses eventos catastróficos, o palestrante afirmou: “eu diria que o grande responsável é o aumento dessa quantidade de gás formador de efeito estufa. E aí a gente fala de atividades industriais, de transporte, queima de combustíveis fósseis, desmatamento, queimadas e o descarte inadequado de resíduos”.
E completou: “Esses fatores geram esse aquecimento na nossa temperatura, porque com o aumento dos gases a camada do efeito estufa fica mais espessa e acaba retendo mais calor na terra. Nos dias hoje observamos que as estações climáticas estão muito diferentes. No passado as coisas eram um pouquinho mais regulares. Entretanto, hoje podemos ter várias estações dentro de uma única estação, além de termos um inverno mais rigoroso, um verão mais intenso, secas mais severas e as oscilações de temperaturas estão com picos cada vez maiores”.
Giovanni destacou que esses eventos climáticos mais intensos também ajudam a aumentar a pobreza em alguns em algumas localidades. Um exemplo disso é o que se passou como o povo do Haiti. “Pode haver queda na produtividade agrícola pela influência dessas intempéries climáticas e, como consequência, disso o aumento dos preços dos alimentos e agravamento de acesso a água potável em determinadas áreas”.
E arrematou: “o que aconteceu no litoral norte de São Paulo foi excesso de chuva nessas encostas muito íngreme, que acabam infiltrando na terra. Essa infiltração cria uma espécie de camada embaixo que precisa escoar por algum lugar. Quando você tem a questão de pedras embaixo dessa terra mais alta, essa terra fica flutuando entre aspas. Essa água por baixo vai empurrar a camada de cima da terra e acaba provocando esses deslizamentos”, indicou.
Riscos e Responsabilidades Inerentes
Já o Ac. Pedro Guilherme contribuiu com respostas a alguns questionamentos sob a perspectiva do direito como um mecanismo de Solução de Conflitos. Dividida em quatro blocos, sua apresentação contemplou o papel do direito de oferecer respostas às situações críticas, a política nacional de proteção e Defesa Civil, a insuficiência do modelo que temos hoje e finalizou com proposições e provocações; incluindo exemplos internacionais.
“Quando eu penso nas formas de resposta eu estou olhando muito mais para esse mecanismo indutor das condutas humanas do que para aquela função punitiva. Mas só para não deixar de endereçar algumas questões que foram levantadas aqui, eu explico que hoje temos o nosso ordenamento uma série de ferramentas para imputação de responsabilidade. Temos a responsabilização civil objetiva do Estado na Constituição, a responsabilidade penal do agente público a possibilidade de impeachment de prefeito, governadores e dos governantes federais”, relatou.
Existem medidas judiciais que visam a compor a omissão pública, como ação de inconstitucionalidade por omissão, mandado de injunção, ação civil pública, ação popular. E tudo isso, se não for bem recheado com o mérito muito bem construído, vira um mecanismo de perseguição, ou vira um espaço de atuação do Poder Judiciário, de um ativismo pelo qual ele preenche essas lacunas como ele bem entende.
Sobre o conteúdo da atuação estatal, Pedro crítica que “por mais que tenha se pensado em uma série de mecanismos, diretrizes, interesses da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, no fim das contas tudo se resume a pendurar embaixo do orçamento da União todas essas medidas, com maior ou menor grau de flexibilização das regras orçamentárias brasileiras, a partir da verificação ou não de um estado de calamidade. Do ponto de vista do diagnóstico, temos uma estrutura interessante que se baseia inclusive no sistema integrado de informações e desastres”, enfatizou.
O acadêmico concluiu sua fala propondo um modelo de seguro paramétrico, de contratação pública, em que o tomador fosse a União e os segurados fossem os Municípios, apresentou como inspiração o modelo caribenho, o modelo mexicano e o modelo sul-africano. Destacou, por fim, que o ferramental jurídico para o modelo já existe, com base no contrato de desempenho e na letra de risco de seguros, duas figuras legislativas recentes.