Férias e fim de ano são sinônimos de estrada cheia. Com mais carros circulando, aumentam as situações de risco: viagens longas, rotas desconhecidas, pressa para chegar, cansaço e trânsito intenso. Nesse cenário, a distração ao volante (especialmente o celular) vira um multiplicador de exposição e aparece com frequência nas discussões sobre acidentes.
Mas quando o assunto é Seguro Auto, a pergunta que realmente importa é: o uso do celular pode afetar a cobertura e levar à negativa de indenização? A resposta exige separar o que é infração de trânsito do que é “agravamento do risco” no contrato de seguro, além de entender como a seguradora regula um sinistro e que tipo de evidência costuma sustentar conclusões.
Por isso, reunimos os principais pontos técnicos, legais e práticos para você dirigir com mais segurança e evitar surpresas na hora em que mais precisa do seguro.
Celular ao volante: o que a lei de trânsito prevê
No Brasil, dirigir usando o celular é conduta tratada com rigor. A regra geral do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê infração por dirigir com apenas uma das mãos, e quando o condutor está segurando ou manuseando o celular, a infração é gravíssima, com penalidade de 7 pontos na CNH e multa de R$ 293,47 (referência do valor-base, segundo órgãos públicos).
Além do aspecto legal, existe o aspecto de segurança viária: entidades médicas e técnicas do trânsito apontam o celular como fator relevante para falhas de atenção e aumento do risco de colisões, sobretudo por reduzir percepção de perigos, tempo de reação e controle do veículo.
Por que, nas férias, o celular pesa ainda mais na estatística de sinistros
Seguradoras enxergam férias como período de maior frequência (mais exposição) e, muitas vezes, maior severidade (batidas em velocidade mais alta, acidentes em rodovias, envolvimento de múltiplos veículos).
O celular, nesse contexto, não é apenas “mais um fator”: ele costuma estar associado a sinistros típicos de distração, como:
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Colisão traseira (o motorista não percebe a redução de velocidade à frente)
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Saída de faixa / abalroamento lateral
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Saída de pista e choque com objeto fixo
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Manobras tardias em acessos, retornos e bifurcações
Nem sempre o aviso de sinistro “declara” o celular como causa. Muitas vezes, o tema surge indiretamente na regulação por meio de dinâmica do acidente, relatos, imagens ou registros oficiais.
Seguro Auto e negativa: quando o uso do celular pode virar problema de cobertura
Aqui entra o ponto mais importante: uma infração de trânsito não equivale automaticamente a perda de cobertura.
O contrato de seguro trabalha com conceitos jurídicos específicos. E o principal deles, quando se discute conduta do motorista, é o agravamento do risco.
O que é “agravamento intencional e relevante do risco” (Lei nº 15.040/2024)
A Lei nº 15.040/2024 (Lei do Contrato de Seguro) estabelece que o segurado não deve agravar intencionalmente e de forma relevante o risco do contrato, sob pena de perder a garantia. A própria lei define “relevante” como agravamento que aumenta de modo significativo e continuado a probabilidade do risco ou a severidade de seus efeitos.
E existe uma trava essencial para negativas: para recusar a indenização, a seguradora precisa demonstrar nexo causal entre o agravamento relevante e o sinistro.
Na prática: alegar “uso do celular” sem prova consistente e sem vínculo com a dinâmica do acidente tende a ser frágil. Já situações com evidência robusta e ligação direta com o evento (por exemplo, colisão causada por evidente distração no exato momento do impacto) podem ganhar outro tratamento — sempre caso a caso, conforme condições gerais da apólice, boa-fé e prova.
Como a seguradora pode verificar se havia celular no momento do acidente
Regulação de sinistro é investigação técnica e documental. Entre as evidências que costumam ser consideradas, estão:
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Boletim de ocorrência e registros de autoridade/concessionária (quando houver descrição objetiva).
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Imagens (câmeras, pedágios, CFTV, dashcams, registros de terceiros).
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Depoimentos de envolvidos e testemunhas (consistência e convergência).
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Perícia (dinâmica: ausência de frenagem, trajetória, pontos de impacto, marcas, telemetria do veículo quando disponível).
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Telemetria/score de direção (quando o produto/serviço prevê coleta).
Sobre “provar pelo celular”: dados do aparelho e de apps envolvem privacidade e LGPD. Em geral, esse tipo de dado só é utilizado de forma válida quando obtido licita e legitimamente, com base adequada (como consentimento aplicável, obrigação legal, ordem judicial, ou outras hipóteses compatíveis) e respeitando finalidade e minimização.
Existe um perfil mais envolvido? E a faixa de 20 a 39 anos?
Estudos de segurança viária e materiais técnicos frequentemente associam maior risco de distração à combinação “alta conectividade + rotina intensa”. Em conteúdos técnicos da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) há discussões que ajudam a explicar por que a faixa de 20 a 39 anos costuma aparecer com destaque em análises sobre uso de celular e direção, especialmente por exposição e hábitos.
Para o seguro, isso não é julgamento. É estatística de risco: frequência, severidade, padrão de condução e perfil de uso do veículo influenciam modelos atuariais e critérios de aceitação.
Isso afeta preço do seguro? O “risco 400% maior” vira aumento de prêmio?
Números como “risco muito maior” ao usar o celular aparecem em campanhas e estudos internacionais sobre distração. O ponto, para o seguro, é: não existe um multiplicador automático aplicado diretamente na apólice (“usou celular = 400% no prêmio”).
O que existe é:
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Modelagem estatística de carteiras (segmentos, regiões, horários, histórico)
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Critérios de aceitação e renovação
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Programas de direção segura com telemetria (quando ofertados), que podem gerar benefícios por boa condução
Ou seja, o comportamento de risco impacta o mercado de forma agregada e, em alguns produtos, pode influenciar condições de forma mais individualizada.
Waze e Google Maps: ajudam a prevenir sinistros?
Sim, quando usados corretamente. Apps de navegação podem reduzir risco por evitar rotas perigosas, diminuir manobras improvisadas, sinalizar trânsito/obras e melhorar planejamento.
O problema é quando o motorista manuseia o aparelho com o veículo em movimento, pois isso combina dois riscos: distração e infração. E, além do risco real de acidente, ainda pode complicar a leitura técnica do sinistro.
Como usar apps de navegação com segurança (e sem “uso indevido”)
Recomendações práticas e objetivas:
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Configure a rota antes de sair.
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Use suporte veicular adequado e mantenha o aparelho no campo de visão sem bloquear a via.
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Prefira comandos de voz e áudio.
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Ative “Não Perturbe ao Dirigir” e silencie notificações.
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Precisa mudar algo? Pare em local seguro (posto/área de serviço) antes de tocar no celular.
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Se houver passageiro, delegue a ele os ajustes.
Checklist do seguro para viajar no fim do ano (para evitar sustos)
Antes de pegar estrada, revise três frentes:
1) Apólice e assistências
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Guincho (quilometragem), pane seca, chaveiro, troca de pneu
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Carro reserva (regras e carências)
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Cobertura de terceiros (RCF-V), vidros, acessórios
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Condutores informados e uso declarado compatível com o real
2) Conduta e prevenção
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Descanso e paradas programadas
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Zero álcool
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Cinto para todos
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Nada de celular na mão: rota pronta e voz ativada
3) Se acontecer um sinistro
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Preserve vidas e sinalize o local
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Acione autoridades/concessionária quando necessário
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Registre fotos e informações essenciais
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Comunique o seguro o quanto antes
Celular ao volante é um risco real e uma infração grave do ponto de vista do trânsito. No Seguro Auto, porém, a análise é técnica e jurídica: para falar em negativa por agravamento do risco, o caminho passa por intencionalidade, relevância e nexo causal, conforme o marco legal vigente.
No fim, a melhor estratégia é simples: planeje a viagem, use navegação com segurança e dirija com atenção plena. Isso reduz a chance de acidente, protege vidas e evita qualquer ruído na regulação de sinistro.
