Confira análise de Dominic Probyn, Diretor de Climate Risk Advisory da Aon
A intensificação das secas associadas às mudanças climáticas tem colocado em risco um dos produtos agrícolas mais consumidos e culturalmente significativos do mundo: o café. A nova edição do Climate Risk Monitor, da Aon, revela que o avanço dos eventos extremos já ameaça a segurança das cadeias globais de suprimento, e demanda respostas mais robustas das empresas, governos e do setor segurador.
O tema ganha relevância adicional neste ano, quando o Brasil recebe a COP30, entre 10 e 21 de novembro. O país, maior produtor global de café, registrou cerca de US$ 139 bilhões em perdas relacionadas à seca nas últimas três décadas. O cenário evidencia um risco crescente, acelerado pelo aquecimento global e reforça a urgência de novas abordagens de gestão climática.
Seca deve dobrar risco à produção de café até 2050
De acordo com o Climate Risk Monitor, condições severas de seca podem ameaçar até 54% da produção mundial de café até 2050, o dobro do nível atual. O impacto é sentido diretamente no Brasil, Colômbia e Vietnã (responsáveis por grande parte da oferta global).
Além de pressionar preços, a redução da produtividade coloca em risco a subsistência de milhões de pequenos produtores. O desafio aparece também no Aon Global Risk Management Survey, em que as vulnerabilidades da cadeia de suprimentos figuram entre as principais preocupações das empresas.

Você sabia?
Brasil e Colômbia respondem juntos por cerca de metade das importações de café dos Estados Unidos.
Mesmo assim, 97% das perdas por seca não têm cobertura de seguro, deixando produtores e empresas expostos.
Sem ferramentas adequadas de gestão e transferência de risco, a oferta global de café pode enfrentar rupturas significativas, e essa ameaça, embora afete um consumo popularizado, vai muito além da xícara diária: trata-se de resiliência econômica e segurança alimentar.
Onde a gestão de risco tradicional falha
Muitas empresas recorrem à diversificação de fornecedores para mitigar impactos. No entanto, mudanças climáticas são fenômenos globais, capazes de afetar simultaneamente regiões diversas. A estratégia, portanto, oferece proteção limitada.
O fator humano agrava o cenário. Na Colômbia, por exemplo, grande parte dos produtores tem média de idade de 58 anos (e eventos climáticos extremos podem acelerar o êxodo rural). Em países como Gana, agricultores já têm abandonado culturas tradicionais, como o cacau, para migrarem a atividades como mineração de ouro.
A volatilidade dos mercados futuros, pressionados por safras fracas, também torna os instrumentos tradicionais de hedge mais caros e menos previsíveis.
Como fortalecer as cadeias de suprimento
Segundo Dominic Probyn, duas frentes são fundamentais para reduzir vulnerabilidades e construir resiliência:
1) Incorporar análises climáticas e conhecimento agronômico
Empresas do setor de alimentos e bebidas devem combinar dados meteorológicos avançados com expertise agronômica para compreender:
- padrões de chuva e temperatura,
- vulnerabilidades específicas de regiões produtoras,
- limites de adaptação das culturas.
Com esses dados, é possível planejar origens alternativas, ajustar investimentos e antecipar impactos.
2) Integrar soluções de seguro às estratégias de cadeia
O seguro surge como ferramenta estratégica e complementar aos mecanismos tradicionais. Ao contrário dos mercados especulativos, oferece:
- capacidade resseguradora de alta classificação,
- prêmios previsíveis e sem chamadas de margem,
- ampla disponibilidade e consistência de cobertura,
- compartilhamento de custos entre players da cadeia,
- proteção sazonal contra eventos extremos e perdas de produtividade.
Estudo de caso: produtores mais resilientes, cadeia mais segura
Um exemplo destacado por Probyn é o programa de seguro criado por uma grande rede global de cafeterias para amparar diretamente seus produtores. A iniciativa oferece cobertura contra chuvas excessivas e falta de umidade em períodos críticos, como floração e crescimento dos frutos.
A proteção é financiada por seguradoras com elevado rating e incentiva práticas de cultivo mais resilientes. O resultado é uma cadeia produtiva mais estável, sustentável e alinhada às necessidades de longo prazo (tanto dos agricultores quanto da própria rede varejista).
Seguro e análise climática como pilares da resiliência
O avanço das mudanças climáticas exige que empresas adotem estratégias que combinem dados, inovação e instrumentos de transferência de risco. Integrar análises climáticas ao conhecimento agronômico e às soluções de seguro contribui para:
- reduzir perdas financeiras,
- garantir continuidade de fornecimento,
- fortalecer comunidades agrícolas,
- ampliar a resiliência global das cadeias de alimentos e bebidas.
Para o setor segurador, há uma oportunidade clara: desenvolver produtos flexíveis e baseados em dados atualizados, fortalecendo parcerias entre corretores, clientes e mercados locais. No Sul Global, o potencial de diversificação e expansão da proteção é significativo, e tende a crescer conforme a penetração do seguro avança.
*Com informações de Aon.
