O Clube de Seguros de Vida e Benefícios do Rio Grande do Sul (CVG-RS) realizou, na manhã de terça-feira (25), em Porto Alegre (RS), a primeira edição do Conexão do Saber deste ano. O evento reuniu advogados especializados em direito securitário do escritório Agrifoglio Vianna para um debate sobre o Marco Legal dos Seguros e seus desdobramentos.
Na abertura do encontro, o presidente do CVG RS, Jean Figueiró, expressou sua satisfação com a realização do encontro e anunciou o Congresso do CVG RS para o mês de junho. Jean também destacou a importância do debate. “Precisamos entender e nos adequarmos a situação, para podermos todos trabalhar dentro da lei”, afirmou.
Atualização do setor
A sócia diretora e fundadora do Escritório Laura Agrifoglio Vianna chamou atenção para um dos aspectos inovadores da nova legislação. “Agora, o estipulante poderá, inclusive, promover demanda judicial contra a seguradora em favor dos segurados e beneficiários. Esse movimento já vinha acontecendo, mas, com a lei, ele ganha respaldo e o estipulante passa a ser um novo agente na busca por direitos junto às seguradoras”.
Também ressaltou que a legislação pecou em não acentuar o caráter consultivo do trabalho dos corretores de seguro. Um dos pontos frisados foi a obrigação de entrega de documentos ao contratante e à seguradora em até cinco dias úteis. Além disso, se houver risco iminente de perecimento do direito, essa entrega deve ser feita com urgência a fim de evitar prejuízos.
Apesar dessas mudanças, Laura pontuou que o papel do corretor como orientador continua essencial. “Mesmo sem estar formalmente detalhado na nova lei, o corretor tem um papel indispensável de esclarecer garantias, explicar contratos e ajudar o segurado a escolher a melhor proteção para sua realidade”.
A jornada do projeto até sua aprovação
O advogado Marcelo Camargo explicou de maneira detalhada a trajetória do marco legal dos seguros. Segundo ele, o projeto começou em 2004, em resposta ao então Código Civil de 2002, que regulava em poucos artigos o contrato de seguro. A iniciativa de 2004 tramitou de forma lenta, mas com amplo debate em seu início. Após, por vários anos esteve arquivado, quase esquecido. Somente em 2017, ele voltou a tramitar, quando recebeu o número PLC 29/17. Somente em 2024 a iniciativa ganhou nova tração no legislativo, e após novos debates, não tão intensos, o projeto foi aprovado no Senado e em seguida na Câmara dos Deputados, e finalmente sancionado no final de 2024. “A redação é bastante diferente do que estamos acostumados. Ela usa termos mais abertos e subjetivos, o que pode deixar a interpretação a cargo dos tribunais, ainda que muito seja complementado pela normatização da Susep”.
Entre as mudanças mais impactantes, Camargo citou a questão do risco: “A lei repete no art. 1º o conceito de seguro do atual art. 757 do CC, no sentido de que o objetivo é garantir os riscos predeterminados em contrato. Entretanto, no art. 9º, amplia este conceito, ao dizer que o contrato ‘cobre os riscos relativos à espécie de seguro contratado’, ou seja, cobre os predeterminados e todos os demais relativos à espécie de seguro em tela, o que é um tanto contraditório e dificultará a interpretação pelo Judiciário”.
Formação dos contratos
Ao abordar a formação dos contratos, Camargo destacou uma novidade importante da Lei nº 15.040/2024: a exigência de um questionário fechado por parte das seguradoras. “Agora, é a seguradora quem deve alertar o segurado a respeito do que é relevante informar no questionário de risco, de modo que, se algum sinistro ocorrer em situação que não estiver abarcada no questionário, pode haver interpretação de que a informação não era relevante para a assunção do risco, logo, descabida seria a negativa de cobertura. Isso exigirá a elaboração de questionários de risco muito mais extensos e completos, o que pode até mesmo atrapalhar o volume de comercialização junto aos mais idosos e aos mais jovens”.
Outro ponto para importante consideração é a Regulação de sinistro, que na nova lei, ganha prazo de 30 dias para ocorrer, pena de a cobertura ser tacitamente aceita: “A Seguradora terá muito pouco tempo para regular um sinistro, pois para a maior parte dos casos, para danos abaixo de R$ 759.000,00, poderá haver a suspensão do prazo uma única vez, voltando a contar pelos dias restantes até atingir os 30 dias permitidos. Se passado o prazo, a seguradora não poderá negar a cobertura”.
Já o especialista Rodrigo Abarno explicou a nova abordagem, ressaltando que, segundo a lei, para o seguro de danos, o agravamento precisa ser intencional, relevante e continuado. Ele trouxe exemplos de casos que, sob a legislação atual, foram considerados agravantes de risco:
- Funcionário sem habilitação que usou um veículo segurado da empresa;
- Segurado que deixou a chave na ignição do carro ao entrar em uma loja de conveniência;
- Disputa de racha envolvendo um veículo segurado;
- Condução na contramão de forma deliberada.
“Nesses casos, houve o reconhecimento do instituto do agravamento. No entanto, com a nova lei, há uma flexibilização maior sobre o que pode ser considerado agravamento e certamente os casos citados não ensejariam o agravamento do risco”.
Abarno abordou a comunicação do agravamento de risco e suas consequências: “O segurado deve informar à seguradora tão logo tome conhecimento do agravamento. Se essa obrigação for descumprida de forma dolosa, há perda da garantia. Se for descumprida por culpa, o contratante pode ser obrigado a pagar a diferença do prêmio apurado.”
Destacou que há uma clara distinção entre seguro de danos e o seguro sobre a vida, pois neste não será possível a negativa de cobertura pelo agravamento de risco, ainda que relevante seja, podendo cobrar apenas a diferença de prêmio.
As mudanças exigirão adaptação, novas estratégias e atenção para garantir que todas as partes envolvidas estejam conforme as diretrizes. Com a lei prestes a entrar em vigor, o mercado enfrenta o desafio de interpretar nuances e aplicá-las de maneira justa e eficiente.