A chamada cirurgia do dente no olho, um implante ocular feito com fragmentos retirados do próprio dente, é capaz de restaurar a visão de pacientes com doenças gravíssimas na córnea.
O Ósteo-odonto-queratoprótese (OOKP) é um procedimento que surgiu em 1963, na Itália, com o Dr. Benedetto Strampelli, mas só foi oficializado como protocolo cirúrgico em 2005. A cirurgia é aplicada e reproduzida em países da Europa, Estados Unidos, Japão, Austrália e Canadá, e responde com níveis aceitáveis de resultados e com boa assertividade intervencional.
O presidente da Comissão Temática de Odontologia Baseada Em Evidências do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP), Dr. Carlos Monson, explica que no Brasil, não existem relatos sobre a execução da técnica e nem estudos em relação ao procedimento. “Também não há informações sobre por quais motivos este procedimento não tem sido realizado entre nós, tampouco o que precisaria para poder viabilizá-lo”, esclarece o Dr. Carlos Monson.
O profissional explica que o procedimento de OOKP é altamente criterioso, por consistir na utilização de uma peça cirúrgica obtida de um fragmento de tecidos dentais frescos, que são extraídos do próprio paciente. O implante é feito a partir do dente canino ou de um dente do siso, caso o paciente ainda o tenha. A escolha, segundo o cirurgião-dentista, faz com que minimize as chances de contaminação por biofilme oral, além de reduzir as chances de infecções secundárias.
“É importante que o fragmento tenha porções de osso alveolar e de ligamentos periodontais adjacentes, os quais devem ser obtidos em condições absolutamente esterilizadas, dentro de um protocolo cirúrgico rigoroso”, diz o presidente da Comissão Temática do CROSP.
Antes que o dente possa ser estabilizado com segurança dentro do globo ocular receptor, ele precisa permanecer acomodado no interior do tecido subcutâneo em outra área do corpo do próprio paciente, para ocorrer sustentação nutricional periférica e compatibilidade biológica efetiva, que ocorrem por processos de vascularização e celularização. Isso, dentro de um intervalo entre 12 e 18 meses.
Dr. Carlos Monson explica que, na prática, o conjunto dente/lente passa a funcionar no corpo do paciente, como um transplante autógeno, que pode reduzir em 95% as chances de rejeição por parte do sistema imunitário, por fim viabilizando a instalação ocular definitiva e com mais chances de ser bem-sucedida.
A Ósteo-odonto-queratorótese é destinada para um grupo específico de pacientes e demanda muito tempo para ser concluída, visto que possui diversas etapas intermediárias e tem alto custo. Apesar disso, os resultados podem ser favoráveis e proporcionam qualidade de vida e saúde mental aos indivíduos que tiveram sua córnea original destruída.
Casos
Em pesquisas realizadas entre 1969 e 2001, com um grupo de 59 pessoas, de diferentes idades, etnias e ambos os sexos, que tiveram 82 implantes oculares realizados. Na pesquisa, foi constatado que 94% dos dentes fixados na córnea pela técnica OOKP permaneceram estáveis no ponto de implantação e funcionando parcialmente por muitos anos. Somente 6% destes permaneceram cegos de forma irreversível.
Segundo informações da pesquisa comentada pelo Dr. Carlos Monson, após o procedimento, alguns pacientes conseguiram retomar tarefas básicas do dia a dia, como comer, vestir-se, tomar banho, usar o banheiro e se locomover, sem a necessidade de ajuda. Até a prática de atividades esportivas foi retomada para alguns pacientes.
A pesquisa também relatou casos de pessoas com “visão em túnel”, como se estivessem enxergando por meio de um buraco de fechadura.
Estética pós cirurgia
O fator estético traz impactos para muitos pacientes, relatos pós-cirurgia de OOKP sobre a aparência se destacam. Isso ocorre porque o olho se torna rosado em torno da lente, em razão da fase de celularização do processo de elaboração da cirurgia. Uma forma de contornar essa situação é cobrir a área ocular externa com uma prótese estética adicional, que simula uma íris.
Impacto do procedimento
O profissional finaliza afirmando que existem estudos sobre pesquisas laboratoriais que buscam a utilização de lâminas de titânio, em substituição aos dentes naturais em Ósteo-odonto-queratorótese. Mesmo com resultados promissores, o cirurgião-dentista alerta que o procedimento ainda não está registrado na National Library of Medicine (NLM) dos Estados Unidos, em que se localizam informações de pesquisa, informações biomédicas e de saúde.
