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ICMS em São Paulo: créditos acumulados só podem ser usados internamente, diz nova norma

Foto por: Scott Graham/ Unsplash Images
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Confira artigo de Thiago Santana Lira – Advogado Sócio em Barroso Advogados Associados, Especialista em Direito Tributário e Aduaneiro, MBA em Gestão Tributária.

O Governo de São Paulo anunciou novas regras sobre como usar créditos de ICMS. As mudanças atingem empresas de vários setores e podem afetar o custo das operações e o planejamento tributário no Estado.

A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo publicou a Portaria SRE nº 45/2025, que altera as regras para aproveitamento e transferência de créditos de ICMS/ST.

Antes, a Portaria CAT 42/2018 permitia a transferência de créditos acumulados de ICMS/ST para contribuintes cadastrados no Estado como sujeitos passivos por substituição tributária. Com a nova redação, essa transferência poderá ser feita apenas para o substituto tributário fornecedor ou para outro estabelecimento do mesmo titular.

Ponto importante é que outra portaria, a SRE nº 65/2025 (e a correspondente Portaria SRE 64/2025) criou um prazo para aproveitamento de créditos relativos a estoques de mercadorias que serão excluídas da sistemática de substituição tributária a partir de 1º de janeiro de 2026. Nesse caso, o crédito poderá ser apropriado em até 24 parcelas, com a primeira parcela a partir da escrituração de janeiro/2026. Essa medida representa um “prazo de adaptação” específico para empresas que tiverem estoques de produtos que sairão da ST — mas não serve como adaptação para as regras gerais de uso/transferência de créditos definidas pela SRE 45/2025.

Entenda melhor a alteração

O regime de substituição tributária existe em setores como varejo, cosméticos, combustíveis e medicamentos. Nesse regime, um contribuinte inicial antecipa o ICMS devido sobre a cadeia até o consumidor final, com base em uma base de cálculo presumida.

Quando a operação não chega ao consumidor final — por exemplo, por isenção ou por não incidência do ICMS em algum passo — pode surgir crédito de imposto. Antes, esse crédito podia ser usado pelo contribuinte, por seus estabelecimentos ou transferido a terceiros.

Com a nova norma, o aproveitamento desse crédito fica limitado: só pode ser usado para quitar débitos do próprio contribuinte ou de outro estabelecimento do mesmo titular. A transferência para terceiros está proibida.

Outra mudança importante foi a revogação do Decreto 67.853/2023, que regulava o Programa “Nos Conformes” do fisco paulista. Esse programa trazia benefícios ao contribuinte adimplente do ICMS, como um modo simplificado de aproveitar créditos acumulados.

O Programa “Nos Conformes” foi criado para melhorar a relação entre fisco e contribuinte e reduzir disputas, especialmente sobre o ICMS — o tributo estadual com maior nível de inadimplência.

No primeiro artigo da lei que institui o programa, são definidos princípios e diretrizes, como: (i) simplificação do sistema tributário estadual; (ii) boa-fé e previsibilidade de condutas; (iii) segurança jurídica por meio da objetividade e coerência na aplicação da legislação tributária; (iv) publicidade e transparência na divulgação de dados; e (v) concorrência leal entre os agentes econômicos.

A lei também criou um mecanismo de classificação dos contribuintes em níveis: “A+”, “A”, “B”, “C”, “D”, “E” e “NC” (Não Classificado). A atribuição dessa classificação cabe ao agente fiscal de renda, conforme o comportamento do contribuinte no cumprimento das obrigações tributárias.

Por exemplo, o contribuinte classificado como A+, segundo o artigo 16 da Lei Complementar nº 1.320/2018, tem vantagens como: ser notificado previamente sobre alguma irregularidade sem que isso inicie um procedimento fiscal, o que lhe permite regularizar a situação e evitar multa e juros; além de poder aproveitar créditos acumulados de ICMS de forma simplificada, entre outros privilégios.

Com a revogação do decreto, o aproveitamento de créditos de ICMS — mesmo para contribuintes A+ — deverá passar por análise prévia da fiscalização, assim como para os demais contribuintes.

O endurecimento das regras decorre, em parte, da “Operação Ícaro”, deflagrada pelo Ministério Público com apoio do GEDEC (Grupo de Atuação Especial de Repressão aos Delitos Econômicos). A operação desmontou um esquema bilionário envolvendo Auditores Fiscais da SEFAZ/SP e grandes redes varejistas, como Ultrafarma e Fast Shop, e investiga o aproveitamento fraudulento de ICMS.

Ainda assim, as mudanças representam retrocessos para os dois lados: o programa “Nos Conformes” vinha aumentando a arrecadação do fisco paulista e facilitando a operação de contribuintes no uso dos seus créditos acumulados — um processo que antes era lento e engessado, e fazia com que muitos créditos ficassem sem uso.

Além disso, endurecer as regras sem observar os princípios do regime não-cumulativo do ICMS pode conflitar com regras constitucionais sobre tributos e gerar grande insegurança jurídica, caso haja negativa arbitrária do direito ao crédito.

A recuperação tributária é uma ferramenta útil na gestão empresarial, porque, no regime tributário atual, contribuintes podem recolher impostos indevidos e recuperar esses valores via compensação, transformando-os em um ativo imediato.

Esse processo precisa ser analisado de forma prévia e criteriosa por uma equipe multidisciplinar, que confirme a existência real do ativo, sua liquidez e a possibilidade de transferência a terceiros — ponto que exige atenção diante das novas regras.

Toda essa análise deve fazer parte de ações de compliance tributário, que revisam procedimentos e regras para manter a empresa em conformidade com a legislação vigente. Eventuais ilegalidades devem ser levadas ao Poder Judiciário.

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