Medidas rigorosas estabilizaram a economia do país, mas levantam questões sobre desigualdade e lições para o Brasil
Nos últimos meses, a Argentina surpreendeu o mundo ao reduzir sua inflação mensal para um patamar inferior a 3%, segundo dados da agência de estatísticas Indec. O resultado foi fruto de medidas drásticas do presidente Javier Milei, como cortes de gastos públicos, privatizações e o fim de subsídios.
Lucas Sharau, especialista em mercados financeiros, certificado CFP e assessor da iHub Investimentos, destaca os desafios enfrentados para alcançar esse marco histórico: “As medidas adotadas foram severas e impopulares. Apesar do impacto inicial negativo, essas ações eram necessárias para corrigir anos de má gestão e excesso de intervenção estatal na economia”, comenta o especialista.
Taxa mensal de inflação nos últimos 24 meses (em %) | ||||||
Mês | Nov 2022 | Jan 2023 | Set 2023 | Dez 2023 | Nov 2024 | Dez 2024 |
Alberto Fernández | 4,9% | 6,0% | 12,7% | 25,5% | – | – |
Javier Milei | – | – | – | 25,5% | 2,4% | 2,7% |
*Javier Milei assume o cargo em dezembro de 2023
Mesmo com os avanços econômicos, o país ainda enfrenta índices alarmantes de pobreza, atingindo quase 40% da população em dezembro, segundo estimativa do Conselho Nacional de Coordenação de Políticas Sociais (CNCPS) do país.
“A inflação elevada é um dos maiores concentradores de renda que existe, penalizando especialmente as classes mais baixas. A baixa inflação abre caminho para uma recuperação sustentável, mas investimentos em educação e programas sociais são essenciais para reduzir a desigualdade”, afirma Sharau.
Abertura de mercado e impacto social
As medidas de controle inflacionário geraram efeitos imediatos na economia real. Embora o aumento dos preços e o desemprego tenham causado um choque inicial, a abertura do mercado argentino para o mundo tem gerado novas oportunidades de negócios, além de estabilizar os preços e promover a volta dos consumidores às compras.
“O descongelamento de preços e a eliminação de restrições à exportação incentivaram o retorno de capital estrangeiro e impulsionaram as exportações. Em um segundo momento, espera-se que isso gere novos postos de trabalho e aumente o poder de compra da população”, explica Sharau.
O que o Brasil pode aprender?
Embora o contexto político e econômico do Brasil seja diferente, as lições do caso argentino não podem ser ignoradas. Atualmente, o Brasil enfrenta desafios como o aumento da burocracia e dos gastos públicos, elementos que também contribuíram para a crise argentina no passado.
“O Brasil ainda está longe de um colapso como o da Argentina, mas ações preventivas são essenciais. Reformas que reduzam o tamanho do Estado e aumentem a eficiência da máquina pública podem evitar que sigamos um caminho semelhante ao do vizinho”, argumenta Sharau.
Apesar das diferenças estruturais, a história recente da Argentina serve como um alerta para o Brasil. “É necessário coragem para tomar medidas impopulares, mas essenciais, a fim de garantir a prosperidade das próximas gerações”, afirma.
Segundo Lucas Sharau, no curto prazo, o Brasil ganharia maior competitividade no mercado internacional, resultando no fortalecimento de nossa moeda (com a queda do dólar) e no aumento do valor agregado das exportações.
No médio prazo, os índices de geração de emprego e renda seriam alavancados significativamente e a inflação seria mantida dentro do intervalo da meta, com expectativas sólidas de estabilidade, possibilitando até a redução do intervalo de tolerância.
No longo prazo, o Brasil teria um crescimento econômico sustentado, recuperando sua posição como uma das cinco maiores economias do mundo — atualmente ocupa a 10ª colocação.