Fundada pelo gaúcho Fernando Goldsztein, a Medulloblastoma Initiative (MBI) transforma a dor pelo diagnóstico do filho em esperança e acelera a descoberta de terapias inovadoras no combate à doença
Quando os médicos disseram a Fernando Goldsztein que não havia tratamento disponível para seu filho Frederico, diagnosticado com um tipo de câncer cerebral chamado meduloblastoma, em 2015, ele não aceitou a sentença. Transformou seu desespero em determinação e, anos depois, criou um modelo revolucionário de pesquisa médica que está encurtando o tempo entre descobertas científicas e tratamentos para milhares de crianças em todo o mundo.
A Medulloblastoma Initiative (MBI), fundada em 2021 pelo brasileiro, vem recebendo importantes reconhecimentos internacionais, inclusive destacada pela prestigiosa publicação MIT Management como um caso exemplar de inovação disruptiva no tratamento de doenças raras. E os resultados já aparecem em tempo recorde.
“Enquanto financiamentos tradicionais destinam apenas quatro centavos de cada dólar para pesquisas sobre câncer pediátrico, com recursos fragmentados entre laboratórios desconectados, criamos um modelo completamente focado em resultados rápidos”, explica Goldsztein.
De décadas para meses: a revolução no tempo da ciência
Em um campo onde novas terapias normalmente demoram de 7 a 15 anos para chegar aos pacientes, a MBI quebrou paradigmas. Em um período inicial de apenas 30 meses, a organização arrecadou 11 milhões de dólares, reuniu 14 dos mais prestigiosos laboratórios e hospitais mundiais, e estabeleceu dois ensaios clínicos promissores que serão lançados em breve, além de três protocolos adicionais que aguardam aprovação da Food and Drug Administration (FDA), a agência reguladora do governo dos Estados Unidos.
A chave para essa aceleração está no modelo de consórcio criado por Goldsztein e o Dr. Roger Packer, renomado neurocirurgião pediátrico americano. O “Consórcio Cure Group 4” estabelece regras incomuns no competitivo mundo da pesquisa médica: zero silos de informação, compartilhamento obrigatório de dados entre instituições e atribuição de tarefas específicas para cada laboratório.
Nos próximos meses, os primeiros protocolos da MBI chegarão aos pacientes: uma imunoterapia avançada que aproveita a resposta natural do corpo contra células cancerígenas teve aprovação do FDA para iniciar testes clínicos e está em fase de recrutamento de pacientes. Há também uma vacina contra meduloblastoma, baseada em RNA mensageiro (mRNA) – tecnologia semelhante à usada contra a COVID-19 -, em fase avançada de desenvolvimento.
O impacto potencial é imenso. Estima-se que 15 mil crianças sejam diagnosticadas anualmente com meduloblastoma em todo o mundo. Até agora, as opções de tratamento eram limitadas e muitas vezes ineficazes.
“Não é uma questão de ‘se’, é uma questão de ‘quando’ encontraremos a cura”, afirma Goldsztein, com a convicção que o MIT Management destaca como representativa do espírito empreendedor que caracteriza os projetos reconhecidos pela publicação.
Um modelo replicável para o futuro da medicina
O reconhecimento da MBI pelo MIT Management não veio por acaso. Em 2023, o prestigioso Children’s National Hospital endossou a iniciativa e convidou Goldsztein para integrar o conselho da fundação do hospital.
Para além do meduloblastoma, o modelo da MBI tem potencial para revolucionar a pesquisa de outras doenças raras infantis. A abordagem de financiamento 100% direto à pesquisa, eliminando custos administrativos, combinada com a colaboração transparente entre instituições, estabelece um novo padrão para como a ciência médica pode operar quando impulsionada pela urgência e inovação.
“Cada investimento na MBI é um passo direto para superar o câncer infantil”, ressalta Goldsztein, que já planeja trazer parte da pesquisa para o Brasil assim que obtiver as validações necessárias nos Estados Unidos.
De uma história de desespero pessoal à criação de um modelo científico revolucionário, a trajetória de Fernando Goldsztein demonstra como o investimento privado, quando direcionado com precisão e urgência, pode transformar não apenas o futuro de seu filho, mas potencialmente de milhares de crianças ao redor do mundo.
Meduloblastoma: fatos e dados
Definição e classificação
- O meduloblastoma é um tumor cerebral maligno primário que se origina no cerebelo
- É classificado como um tumor embrionário do sistema nervoso central (SNC)
- Existem quatro subgrupos moleculares principais: WNT, SHH, Grupo 3 e Grupo 4, cada um com características genéticas e prognósticos distintos
Epidemiologia
- É o tumor cerebral maligno mais comum em crianças
- Representa cerca de 20% de todos os tumores cerebrais pediátricos
- Incidência média entre 5-9 anos de idade
- Mais frequente em meninos do que em meninas (proporção aproximada de 1,5:1)
- Pode ocorrer em adultos, mas é menos comum (menos de 1% dos tumores cerebrais em adultos)
Sintomas
- Dor de cabeça, especialmente pela manhã
- Náuseas e vômitos devido à pressão intracraniana elevada
- Problemas de equilíbrio e coordenação
- Visão dupla ou borrada
- Irritabilidade e letargia
- Em bebês: aumento do perímetro cefálico e fontanela abaulada
Diagnóstico
- Ressonância magnética (RM) com contraste é o exame de imagem preferencial
- Tomografia computadorizada (TC) para avaliação inicial
- Exame do líquido cefalorraquidiano para detectar células tumorais
- Biópsia para confirmação histológica e classificação molecular
- Mielograma para verificar disseminação na medula espinhal
Tratamento
- Abordagem multidisciplinar que geralmente inclui:
- Cirurgia para ressecção máxima segura do tumor
- Radioterapia cranioespinhal (exceto em crianças muito pequenas)
- Quimioterapia (regimes baseados em cisplatina, ciclofosfamida, vincristina)
- Tratamentos adaptados ao risco (standard vs. alto risco)
- Terapias direcionadas em desenvolvimento para subtipos específicos
Pesquisas e avanços recentes
- Terapias direcionadas baseadas em perfis moleculares
- Estudos para redução da dose de radiação em pacientes de baixo risco
- Imunoterapias em investigação para casos recorrentes