Embora o estudo tenha identificado avanços, setor ainda falha ao não incluir critérios socioambientais em suas políticas
O novo Ranking da Atuação Socioambiental de Instituições Financeiras (RASA), divulgado pela Associação Soluções Inclusivas Sustentáveis (SIS), mostra que, entre as 13 seguradoras avaliadas com base em padrões internacionais e dados públicos, o melhor desempenho foi da Mapfre. A seguradora ficou em primeiro lugar no ranking geral, seguida por Bradesco Seguros e Allianz.
Foram avaliados 28 temas, como mitigação e adaptação às mudanças climáticas, impactos do negócio na biodiversidade terrestre, eficiência hídrica, entre outros. “Essa avaliação é essencial, uma vez que a compreensão sobre o que compõe a agenda ASG ainda é diversa e, por vezes, limitada. Mas o conceito abrange um conjunto mais amplo de questões interligadas, incluindo saúde e segurança no trabalho, diversidade, impactos em comunidades tradicionais, relações com consumidores e combate à corrupção”, explica Luciane Moessa, diretora Executiva e Técnica da SIS.
“Todos esses fatores devem ser considerados pelas instituições no processo de subscrição de riscos via seguros e na gestão de investimentos, de forma a garantir uma atuação financeiramente sólida e socialmente responsável”, completa. Entre os pontos positivos, o relatório ressalta a oferta crescente de produtos, como seguros para veículos elétricos e híbridos e para painéis solares, bem como para bicicletas, embora isso esteja ainda muito longe de representar uma porção significativa do portfólio.
As notas obtidas, contudo, indicam o longo caminho que as seguradoras ainda têm a percorrer na inclusão de critérios socioambientais em suas políticas e na transparência dessas informações. Em uma escala que vai de zero a cem, a líder do ranking obteve 12,80 pontos; o segundo e terceiro lugar ficaram com 8,77 e 7,15, respectivamente. Já Itaú Seguros ficou na última posição, com desempenho muito abaixo da média (0,25).
O estudo revelou que nenhuma seguradora pontuou em aspectos essenciais, como a relevância dos riscos ASG no processo decisório, composição setorial do portfólio de investimentos e conhecimento sobre a localização das atividades financiadas — pontos críticos para a uma gestão efetiva de riscos socioambientais. O ranking RASA indica ainda que a maioria das seguradoras brasileiras ainda está longe de tratar com uma boa abrangência critérios socioambientais e de governança (ASG) nas Políticas de Sustentabilidade.
Segundo Luciane Moessa, um dos que pontos críticos que o estudo revela, considerando as fontes de informação utilizadas, é a diminuta abrangência das bases de dados consultadas para identificação de riscos socioambientais e climáticos das potenciais empresas seguradas e receptoras de investimentos. Dessa forma, seguros estão sendo concedidos e investimentos estão sendo realizados em empresas envolvidas em ilícitos ambientais e sociais, sem falar que seu desempenho nesses temas, que deveria ser relevante ao menos para os investimentos, ao que tudo indica, não é considerado.
Mesmo com discursos públicos de comprometimento com sustentabilidade, a prática nas seguradoras ainda é incipiente. O setor tem um papel estratégico na transição para uma economia de baixo carbono. Mas, quando se tem contato com a área de sustentabilidade das seguradoras, percebe-se que o que elas fazem é gerenciar os impactos ambientais, sociais e climáticos das suas instalações físicas, ações filantrópicas (e esses dois temas sequer são avaliados na Metodologia do RASA) e fazer o marketing das pouquíssimas iniciativas relativas a incorporar de critérios ASG nos seguros e nos investimentos.
“O tema ainda sequer chegou ao core business, sendo normalmente tratado por Diretorias de Comunicação, Marketing e/ou Relações Institucionais e não por áreas-fim”, afirma Luciane Moessa. Os resultados deste ciclo foram apresentados em uma live com a participação de Luciane Moessa, que coordena a iniciativa, e mais três convidados. São eles: Karina Feliciano (IDEC – Instituto de Defesa do Consumidor), Luís Meneses (Global Canopy Brasil) e Merel van der Mark (Forest & Finance Brasil).
De acordo com Karina Feliciano, o estudo apresentado pela SIS foi bem completo e envolveu extensa análise de documentos. O que mais chamou sua atenção foi a necessidade de mais transparência quanto aos investimentos feitos pelas seguradoras. “Um ponto essencial é o perfil de risco das empresas que recebem esses investimentos. É muito importante saber onde esse dinheiro está sendo aplicado. A transparência em relação aos investimentos ainda é baixa e, quando existe, é bem vaga”, disse. Ela também destacou a necessidade de aumentar a oferta de seguros contra riscos ambientais, como alagamentos, entre outros. “É primordial garantir que esse tipo de seguro seja acessível para que mais pessoas possam estar protegidas”, concluiu.
Luís Meneses destacou a robustez do estudo com relação aos dados de accountability e ressaltou a necessidade, neste momento, de dar ênfase à transparência para “manter a batalha constante pela preservação dos dados abertos”. Ele afirmou que o desempenho das seguradoras de forma geral foi decepcionante, com pouca ou quase nenhuma evolução desde a avaliação anterior para cá. “O que realmente chama atenção é o baixo nível de ambição das seguradoras quando o assunto é a agenda ASG. As pontuações são muito baixas — 45% das seguradoras têm notas abaixo de 2%. A Mapfre se destaca nesse cenário quando comparada ao ciclo anterior, pois apresentou uma evolução de 11%, enquanto 55% das seguradoras tiveram queda nas pontuações, algumas com reduções acima de 70%”.Destacou ainda que, em temas como clima, natureza e pessoas, que são centrais para a agenda ASG, ainda há muita falta de coesão. Como também falta, segundo ele, quando o tema é o impacto nas comunidades tradicionais. “A maioria das seguradoras — quase 80% — simplesmente ignora o tema”.
Já Merel van der Mark centrou sua apresentação comentando as avaliações feitas pela Forest & Finance Brasil e sua relação com o estudo da SIS, o que reforça a consistência da metodologia. Ela também enfatizou a importância de as seguradoras desenvolverem políticas e práticas de investimento mais transparentes. “A transparência é essencial para garantir que os recursos estejam sendo aplicados de forma responsável, especialmente quando se trata de temas críticos, como desmatamento”, explicou.De forma geral, a falta de transparência e compromisso com a divulgação de informações continua sendo um grande problema apontado também pelos debatedores – o que acaba sendo um contrassenso: o setor tem uma performance muito baixa e uma vulnerabilidade enorme frente aos riscos climáticos e ambientais.