Professor da USP destacou impactos econômicos, sociais e éticos da crise climática e reforçou o papel do seguro como instrumento de adaptação e resiliência
O 3º Workshop de Seguros para Jornalistas, promovido pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), contou com uma apresentação contundente de Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da USP e um dos principais especialistas em mudanças climáticas do Brasil. Sua palestra abordou como o aquecimento global e os eventos climáticos extremos estão moldando a economia, afetando a saúde e pressionando a indústria de seguros em todo o mundo.
O aquecimento global e seus impactos diretos
Segundo Artaxo, os cenários mais recentes do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) apontam para um aumento médio global de até 3°C até o fim do século, caso não haja ações mais rigorosas de mitigação. No Brasil, esse número pode ser ainda maior: até 4°C de aquecimento médio, com consequências drásticas.
Entre os efeitos já em curso estão a redução de chuvas no Brasil Central e na Amazônia, o avanço de áreas de déficit hídrico para regiões agrícolas estratégicas como Mato Grosso e Rondônia, e o risco à produção de alimentos em escala global. “Um Brasil baseado apenas no agronegócio pode não ser viável nas próximas décadas”, alertou.
Setores mais vulneráveis
O professor destacou que alguns setores da economia serão mais impactados que outros. Entre eles, o agronegócio, a geração de energia elétrica e, especialmente, a indústria de seguros, que precisa lidar com a crescente imprevisibilidade dos riscos.
“O nível de confiança na indústria de seguros precisa aumentar. Cada novo desastre climático abala a credibilidade do setor. Em alguns países, já se discute até a criação de seguros obrigatórios contra desastres naturais de grande porte”, afirmou Artaxo.
Eventos extremos cada vez mais frequentes
O especialista ressaltou que eventos que antes ocorriam a cada 50 anos poderão acontecer até 39 vezes mais em um cenário de aquecimento de 4°C. Isso significa enchentes, secas, ondas de calor e vendavais muito mais comuns e intensos.
No Brasil, a situação é ainda mais crítica: apenas em 2024, as enchentes no Rio Grande do Sul causaram prejuízos de cerca de R$ 100 bilhões, evidenciando a vulnerabilidade do país. “Desde a década de 1980, a frequência de eventos extremos quadruplicou. Temos que nos preparar para um futuro de muito mais instabilidade climática”, frisou.
Saúde, ética e responsabilidade social
Além dos impactos econômicos, Artaxo chamou atenção para os efeitos da crise climática na saúde humana. Doenças transmitidas por vetores, ondas de calor e piora na qualidade do ar tendem a se intensificar, afetando diretamente seguros de saúde e de vida.
O professor também ressaltou o aspecto ético do problema: “Quem nasce hoje viverá seus 70 anos em um planeta muito menos favorável para atividades socioeconômicas. A pergunta que fica é: que direito temos de comprometer o futuro de quem sequer nasceu?”.
O papel do setor de seguros
Para Artaxo, a indústria seguradora ocupa posição central no enfrentamento da crise climática. Por lidar diretamente com riscos, tem condições de influenciar governos, empresas e a sociedade a se preparar melhor para os impactos. “O setor de seguros é um dos mais vulneráveis às mudanças climáticas, mas também pode ser um dos mais relevantes na construção de uma sociedade resiliente e sustentável”, concluiu.