A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, reafirmou o entendimento fixado no REsp 1.248.975, no sentido de que a Fundação Cosipa de Seguridade Social (Femco) – atual Previdência Usiminas – é responsável pelo pagamento de aposentadoria complementar a empregados da antiga Companhia Ferro e Aço de Vitória (Cofavi), em razão de convênio firmado entre as duas entidades em 1985. Apesar do precedente da seção, ainda havia divergências de posicionamento nas turmas de direito privado, sobretudo na Terceira Turma.
Para a seção, a peculiaridade da previsão de antecipação do benefício complementar – ou seja, antes do período de formação da reserva de garantia – não retira a responsabilidade da Femco pelo pagamento, inclusive porque a entidade previdenciária aderiu ao convênio nesses exatos termos.
"O entendimento firmado pela Segunda Seção no REsp 1.248.975 não deixa margem à dúvida, no sentido de que a falência da patrocinadora ou o eventual esgotamento dos recursos do fundo de previdência não constitui fato extraordinário ou imprevisível hábil a isentar a entidade de previdência privada da obrigação de pagar os benefícios a que se comprometeu, notadamente em razão da autonomia da relação entre o beneficiário e o ente de previdência complementar, concluindo-se, assim, pela responsabilidade da Femco", afirmou o ministro Luis Felipe Salomão.
De acordo com os autos, o convênio entre a Cofavi e a Femco foi firmado em 1985. Em 1990, a Cofavi interrompeu o recolhimento das contribuições e, consequentemente, o repasse de valores à Femco. Com a falência da Cofavi, em 1996, a Femco decidiu parar de pagar as complementações aos aposentados, o que gerou uma série de cobranças judiciais da aposentadoria complementar – entre elas, a do autor do processo analisado pela seção. Há informações de que estariam em trâmite cerca de 200 ações judiciais sobre o assunto.
Para Usiminas, única obrigação da Femco era administrar as contribuições da Cofavi
Em primeiro grau, o juiz excluiu a Cofavi do processo e condenou a Femco ao pagamento da complementação de aposentadoria, sentença mantida pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo.
No recurso especial, a Previdência Usiminas alegou que a única obrigação contratual da Femco era administrar as contribuições repassadas pela Cofavi, de modo que, com o esgotamento dos recursos do fundo, não haveria como atribuir à entidade previdenciária a responsabilidade pelo pagamento dos benefícios.
Divergências geram insegurança jurídica e consequências para os aposentados
Relator do recurso, o ministro Luis Felipe Salomão explicou que, em 2015, no REsp 1.248.975, a Segunda Seção pacificou o tema e concluiu pela responsabilização da entidade previdenciária na manutenção do pagamento da complementação de aposentadoria dos empregados da Cofavi.
Contudo, em 2017, ao julgar o REsp 1.673.367, a Terceira Turma concluiu que a Femco não seria responsável pela complementação, tendo em vista que não foi constituída a reserva garantidora dos benefícios e, por consequência, não haveria direito adquirido dos participantes.
De acordo com o relator, a dispersão jurisprudencial do tema no STJ tem causado não apenas insegurança jurídica, mas também "desastrosas consequências às partes envolvidas – aposentados com idade já avançada, em sua grande maioria".
Salomão explicou que a Femco, entidade com natureza jurídica de direito privado, administra plano de benefícios para dois grupos distintos, os quais, no caso, possuem patrocinadores diferentes – a Cofavi e a Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa).
Com base em precedentes do STJ, o ministro apontou que a independência patrimonial em planos formados por multipatrocinadores – como no caso dos autos – não afasta a obrigação da continuidade no pagamento dos benefícios.
"Isso porque, justamente em razão da independência da relação jurídica estabelecida entre a entidade de previdência privada e seus segurados, entre a entidade de previdência e a patrocinadora, assim como da relação entre o segurado e a patrocinadora, é que deve ser assegurado o cumprimento das obrigações previstas no âmbito de cada relação jurídica, que, sim, revelam-se autônomas e independentes umas das outras", complementou.
Convênio previa a concessão do benefício sem reserva garantidora
No caso dos autos, Salomão reiterou que o próprio convênio previu a hipótese da concessão do benefício sem a prévia reserva garantidora, motivo pelo qual não é possível prevalecer a premissa do não implemento da condição para o recebimento do benefício.
Em seu voto, ele enfatizou que a alegação de impossibilidade fática do pagamento em virtude do exaurimento do fundo Femco-Cofavi não pode prevalecer sobre a responsabilidade legal e jurídica originada da relação previdenciária, mesmo porque, ao firmar o convênio, a Femco concordou com os seus termos, inclusive em relação ao adiantamento, pela entidade previdenciária, das contribuições que seriam de responsabilidade da Cofavi.
O relator também entendeu não ser possível reconhecer que o fato de a entidade previdenciária ter habilitado os seus créditos na falência da Cofavi a eximiria do pagamento do benefício. Sobre esse ponto, o ministro reforçou o entendimento da Terceira Turma no REsp 1.673.890, no sentido de que, se fossem acolhidas as alegações da entidade de previdência, a Femco receberia da massa falida as contribuições que não foram repassadas pela Cofavi e, por outro lado, não pagaria as aposentadorias complementares dos empregados – gerando, assim, possível enriquecimento sem causa.