Muita calma nessa hora. Uma decisão como essa exige uma análise mais cuidadosa. No final, pode ser que você ainda queira abrir uma holding. Mas pode ser que não
A febre da holding: de onde veio essa moda?
Tenho certeza de que você já ouviu essa expressão em algum momento da vida: holding para cá, holding para lá. Entre influenciadores ou investidores, advogados ou contadores, pelos grupos de WhatsApp, enfim, parece que todo mundo resolveu “abrir uma holding” — como se fosse a solução definitiva para proteger o patrimônio e organizar a sucessão.
Há uma justificativa para isso?
A origem da moda
A popularização da holding tem raízes em dois fatores principais:
- A promessa de economia tributária: durante muito tempo, vender a ideia de que uma holding “paga menos imposto” foi uma forma fácil de atrair interessados. Em alguns casos, isso até fazia sentido. Em outros, era apenas uma meia verdade — ou uma armadilha.
- A busca por controle e organização familiar: famílias com patrimônio relevante começaram a procurar formas de evitar brigas entre herdeiros, facilitar a sucessão e manter os bens “em casa”. A holding apareceu como uma solução prática, com aparência de sofisticação e segurança, importada de modelos adotados em outros países.
O problema da receita de bolo
O instituto da holding sempre foi muito utilizado lá fora — e acertamos muito ao trazê-lo para cá.
Todavia, o que era para ser uma ferramenta estratégica virou uma solução genérica. Muita gente começou a oferecer “pacotes prontos” relacionados à holding, sem entender o contexto de cada família, avaliar riscos ou explicar as consequências jurídicas e tributárias envolvidas.
Como resultado, houve quem pudesse se beneficiar de reduções de ganho de capital na venda de imóveis, por exemplo, e que acabou desperdiçando a oportunidade por ter integralizado em uma holding um imóvel que não deveria ter sido integralizado. A decisão, padronizada, acaba elevando os custos tributários para essas vendas, por nunca ter valido a pena, sem falar em outros custos que não seriam necessários em determinadas situações.
Falta questionar: será que você realmente precisa de uma holding?
Antes de abrir uma empresa para “organizar o patrimônio”, é preciso fazer uma pergunta mais importante: qual é o seu objetivo? Evitar o inventário, isolar riscos empresariais ou prevenir conflitos familiares? Ou apenas e tão somente fazer o que todo mundo está fazendo?
A holding é útil, e não estamos aqui para demonizá-la. Pelo contrário. Queremos que você pense se esse instrumento faz sentido dentro de um planejamento maior e principalmente se ele serve para você.
Vamos explorar isso um pouco melhor.
O que é, de fato, uma holding?
A palavra holding vem do inglês to hold — que, em tradução livre, significa “segurar” ou “controlar”, a depender do contexto. Dentro da ideia do planejamento patrimonial, sucessório ou empresarial, é, apelando para a redundância, uma empresa criada para controlar bens ou outras empresas.
Geralmente, chamamos de patrimonial a holding criada para concentrar imóveis, investimentos e outros bens, e empresarial a usada para controlar participações em outras empresas.
Em outras palavras, a holding patrimonial gerencia bens e investimentos, e a holding empresarial gerencia ações ou quotas de um (ou mais) sócio ou acionista em uma outra empresa.
Agora vamos desmistificar algumas coisas. É importante que você saiba que a holding não é uma forma automática de pagar menos imposto, nem de blindagem infalível contra dívidas. Porém, nossa maior preocupação é que você saiba que a holding não é uma solução pronta para qualquer família.
Criar uma holding sem planejamento pode gerar custos, burocracia e até problemas tributários. É como comprar uma casa sem saber se você vai morar nela, alugar ou vender.
O que mudou em 2025: novas regras, novos cuidados
Com a Lei Complementar 214/2025, que implementa a primeira fase da Reforma Tributária, o cenário mudou — e muito. A princípio:
Nova carga tributária para holdings patrimoniais que exploram imóveis (locação, cessão, arrendamento).
- Fim de algumas isenções e restrições ao uso de créditos tributários.
- Regime de transição até 2033, com alíquotas reduzidas.
- Imposto de doação progressivo até o limite de 8%, embora a maioria dos estados ainda não tenha aderido à mudança.
Trocando em miúdos: a holding ainda pode ser vantajosa, mas continua exigindo tanto cuidado quanto antes. O que antes era oferecido uma “economia certa” continua dependendo de planejamento, prazos e contratos bem estruturados, e com certeza não existem modelos prontos, ainda que destinados a famílias ou empresas semelhantes.
Existem outras opções?
É claro que sim. Não só outras opções, como alternativas que, muitas vezes, podem ser mais simples, mais baratas e mais eficazes.
- Doação com reserva de usufruto: transfere-se o bem em vida, mas mantém-se o controle e o uso.
- Testamentos: permitem organizar a sucessão com cláusulas específicas. Em certos casos, podem ajudar em casos de invalidez (diretivas antecipadas de vontade).
- Fundos fechados: usados para concentrar investimentos com regras próprias (também sofreu impacto tributário por alterações legislativas recentes no Brasil).
- Seguros de vida: com cláusulas estratégicas, podem ser usados para equalizar heranças ou proteger dependentes.
Cada uma dessas ferramentas tem vantagens e desvantagens. O segredo está em combinar soluções, não em apostar tudo em uma só.
Em resumo: planejamento não é moda, é estratégia
A holding é útil? Sim. Ela serve para você? Não necessariamente.
Sugerimos, qualquer que seja o caso, que você não se encante com modelos prontos ou pacotes padronizados. Não faz nenhum sentido que seus bens, sua família e seus negócios sejam tratados como quaisquer outros. Pelo contrário: um bom planejamento só faz sentido se estiver alinhado com as suas expectativas e respeitar as particularidades e filosofias e os princípios valiosos para você. Se não, com toda a honestidade, convém manter as coisas como estão.
Continuando a apelar para a sinceridade extrema: não há receita de bolo. Tudo que tem a ver com esse tema é um processo que exige ouvir, analisar e avaliar estratégias. E, acima de tudo, exige que você entenda o que está fazendo — e por quê.
Uma vez mais, o objetivo não é desincentivar o uso da holding. Talvez, no fim, a holding seja mesmo o melhor caminho. Mas talvez não.
E se não for, esteja absolutamente tranquilo: outros instrumentos podem te atender tão bem quanto uma holding. Talvez até melhor.