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Ser ou não ser mãe, eis a questão para mulheres que desejam uma carreira sustentável

Patrícia Ajeje, CEO da Chem-Trend América do Norte / Foto: Divulgação
Patrícia Ajeje, CEO da Chem-Trend América do Norte / Foto: Divulgação

Confira artigo de Patrícia Ajeje, CEO da Chem-Trend América do Norte

Uma consideração importante para as mulheres, especificamente mulheres que querem ter uma família, é como a maternidade afetará suas carreiras. A famosa frase dita por Hamlet na peça de William Shakespeare, “ser ou não ser, eis a questão”, significa existir ou não existir, e, em última instância, viver ou morrer. Adaptada ao contexto das profissionais mães se refere a continuar existindo para o mercado de trabalho. A disparidade salarial de gênero, portanto, é apenas a ponta do iceberg. A difícil decisão que as mulheres enfrentam não é maternidade ou carreira, a verdadeira questão é: por que é preciso escolher? 

Embora 97 dos 190 países analisados pelo Banco Mundial apresentem esforços legislativos para incluir leis de igualdade e transparência salarial, o progresso sustentado na redução das disparidades depende de mudanças mais profundas nas normas sociais e culturais, e na flexibilidade do local de trabalho, que afeta a forma como homens e mulheres equilibram suas carreiras e vidas familiares. Enquanto a maternidade leva muitas mulheres a suspenderem suas carreiras ou a colocarem suas aspirações profissionais em segundo plano, a paternidade tem o efeito oposto sobre os homens.

Uma pesquisa do Departamento do Censo dos Estados Unidos (United States Census Bureau) mostra que a parcela de mulheres que estão trabalhando cai 18% no trimestre em que dão à luz seu primeiro filho e, para aquelas que continuam trabalhando, os ganhos  diminuem em média US$ 1.861. Ainda que haja uma recuperação durante os seis primeiros anos, ela não é suficiente para devolver às mulheres sua trajetória de ganhos antes do parto. 

A penalidade para as mulheres mães na Guatemala, em Honduras e no México chega a 5% na participação no trabalho, segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Contraditoriamente, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita no México, por exemplo, poderia aumentar permanentemente em mais de 6%, caso fossem implementadas  políticas de aumento da participação de mulheres no mercado de trabalho. No país, para além da queda de 44% em seus salários, ao se tornarem mães, as mulheres têm um aumento de 16 horas de trabalho não remunerado (cuidados com a casa e os filhos durante a semana), e essa situação não ocorre com os homens quando eles se tornam pais. 

No Brasil, pesquisas feitas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) revelam que quase 50% das mulheres são demitidas após a licença maternidade, padrão que se perpetua, inclusive, 47 meses após a licença, sendo que a maior parte das saídas se dá sem justa causa e por iniciativa do empregador. Em contrapartida, mulheres que são promovidas grávidas ou após a licença-maternidade integram um grupo seleto de situações em empresas que priorizam as competências profissionais. Sequer há dados estatísticos robustos a respeito, já que elas ainda são a exceção, não a regra. A queda salarial pode chegar a 39% abaixo da renda dos homens casados e com filhos (R$ 3.438) e o aumento do trabalho não-remunerado chega a 20 horas por semana. Paradoxalmente, o consumo infantil no mercado brasileiro é de R$ 50 bilhões anuais e cresce 14% a cada ano. Ou seja, as mulheres são retiradas do mercado de trabalho ou seus salários são reduzidos quando a renda se torna mais necessária. 

Independentemente do nível de desenvolvimento dos países, os dados apontam  um abismo entre a realidade da maternidade no mundo corporativo e as políticas organizacionais de acolhimento dessa escolha. Eu tenho o privilégio de não fazer parte desta estatística. Eu tive minha licença maternidade respeitada, minhas necessidades foram consideradas, não só quando retornei, mas até hoje no contexto profissional. Mulheres que trabalham em empresas de grande porte e com salários mais altos têm maior probabilidade de permanecer com esses empregadores após o parto, mas isto não deveria ser uma exceção. Acolher a parentalidade nas organizações não pode ser um benefício restrito a poucas mulheres, mas sim uma nova competência organizacional. Criar ambientes mais seguros para que as mães possam viver sua maternidade de maneira saudável, se manterem crescendo e evoluindo profissionalmente, para que possam construir carreiras sustentáveis, deve ser uma pauta estratégica. 

A realização pessoal e a profissional precisam caminhar juntas, tanto para homens quanto para mulheres. A disparidade salarial de gênero e a penalidade da maternidade, assim como qualquer outra forma de discriminação, têm a ver com poder e quem a sociedade decide que é digno dele. Comprometer-se com a erradicação das disparidades salariais e de oportunidades de carreira entre homens e mulheres permitirá um futuro inclusivo e há muito esperado no local de trabalho.

*Patrícia Ajeje é mãe, engenheira química e administradora de empresas, com pós-graduação em Marketing e Finanças, pela Fundação Getulio Vargas, Liderança Organizacional, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, e MBA em Marketing pela Universidade de São Paulo. Com mais de 20 anos de atuação no setor químico, estando à frente de grandes indústrias no Brasil, durante os últimos cinco anos ocupou o cargo de CEO na Chem-Trend Hemisfério Sul (América do Sul e África do Sul), e, paralelamente, na SurTec Hemisfério Sul (2022-2023), ambas empresas do Grupo Freudenberg. Atualmente é CEO da Chem-Trend América do Norte (EUA, Canadá e México) e desempenha um papel ativo e influente no Comitê Executivo Global da Chem-Trend. 

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