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As transformações do mercado de trabalho e a previdência privada

Laís Guerra Juventino Dias, advogada e membro do Grupo de Privacidade da Previdência Usiminas / Foto: Divulgação
Laís Guerra Juventino Dias, advogada e membro do Grupo de Privacidade da Previdência Usiminas / Foto: Divulgação

Confira artigo de Laís Guerra, advogada e membro do Grupo de Privacidade da Previdência Usiminas

Em uma concepção tradicional, o mercado de trabalho é composto por empresas oferecendo vagas de emprego e por trabalhadores. Entretanto, as formas de trabalho vão muito além da tradicional relação entre empregado e empregador. Segundo Carolina Tupinambá, “a transformação na identidade dos trabalhadores, que não se limita mais à tradicional dicotomia entre empregado e empregador. Agora, eles podem estar envolvidos em uma variedade de arranjos contratuais”.

Algumas dessas transformações no mercado de trabalho podem impactar os caminhos nos quais a previdência privada pretende traçar rumo ao seu crescimento. A situação dos jovens, que vem encontrando dificuldades de ingressar no mercado de trabalho, é um dos exemplos. Além disso, há a tendência de aumentar o número de pessoas mais velhas, inclusive de aposentados, no mercado de trabalho. Por fim, a própria natureza da relação trabalhista vem se desenhando de formas mais amplas do que a relação celetista. 

Em cada uma das mudanças acima existem desafios e oportunidades que podem ser compreendidas a favor do propósito de crescimento da previdência privada no Brasil. Segundo o relatório elaborado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2020, 23,3% dos jovens não estavam trabalhando, nem estudando e nem em treinamento (Nem-Nem). Este percentual representa um aumento de 1,5% em relação ao ano anterior e é um dado não visto há quinze anos.

Essa geração, conhecida como “Nem-Nem”, está tornando as perspectivas do mercado de trabalho para os jovens ainda mais desafiadoras. A falta de envolvimento educacional e profissional é motivo de preocupação em razão dos efeitos na vida pessoal e para o desenvolvimento da sociedade. Nessa situação, esses jovens enfrentam desafios relevantes relacionados a inserção social e econômica, que podem desencadear perspectivas de futuro limitadas, levando a um ciclo de exclusão social e pobreza. 

Paralelamente à situação dos jovens, há a população idosa, que vem crescendo.  Junto a esse crescimento, vem a necessidade de inserção dessas pessoas no mercado de trabalho. Um estudo da PwC com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) estima que em 2024, 57% da força de trabalho do Brasil terá 45 anos ou mais. Segundo a pesquisa da Ernest & Young e a Agência Maturi, feita em 2022, de 6% a 10% do quadro corporativo das empresas é composto por pessoas com mais de 50 anos, e 78% das empresas se consideram etaristas.

Desta forma, observa-se duas vertentes, a primeira com jovens com dificuldades de entrar no mercado de trabalho e em uma proporção populacional menor. E a segunda, pessoas mais velhas vivenciando entraves para permanecer e/ou retornar para o mercado de trabalho.

Embora possa parecer uma situação antagônica, ambos os casos apresentam desafios e oportunidades. Nos dois casos são necessárias políticas públicas e ações do setor privado voltadas para fomentar a inserção dos jovens e idosos no mercado de trabalho.

O relatório Global Employment Trends for Youth 2022 indica a implementação conjunta de medidas verdes e azul (recursos oceânicos e a sua utilização sustentável), digitais e no setor de cuidados (saúde e educação) como potenciais criadores de 139 milhões de empregos adicionais para trabalhadores de todas as idades.

Sob a ótica da previdência complementar há uma oportunidade relevante, pois, na medida em que esses desafios forem vencidos, os grupos acima poderão ingressar no mercado de trabalho e haverá a possibilidade de mais pessoas terem acesso a um plano de previdência.

Paralelamente, as transformações na natureza da própria relação de trabalho trazem potenciais impactos para o setor de previdência complementar. De acordo com o historiador Yuval Noah Harari, hoje estamos habituados a dividir a vida em duas fases, a primeira voltada para o estudo e a segunda para o trabalho. No entanto, segundo ele, em 2050 esta divisão estará ultrapassada. E o historiador acrescenta que um novo modelo será utilizado, em que as pessoas partirão da premissa do lifelong learning (formação contínua, é a tradução literal), em que elas vão continuar a aprender ao longo de toda a vida, inclusive após 50 anos de idade.

A ideia do aprendizado contínuo é coerente com as mudanças estruturais dos modelos de trabalho, especialmente com relação a inserção da inteligência artificial nas atividades laborais. As pessoas precisarão adquirir conhecimentos para se manter no mercado de trabalho e ainda para potencializar suas habilidades utilizando as novas ferramentas de tecnologia.

Dentre os efeitos da tecnologia já visíveis na natureza das relações de trabalho está a chamada gig economy, que se caracteriza pela relação autônoma de trabalho, sem vínculo único com o empregador e sem os benefícios de uma carteira de trabalho assinada, mas com autonomia, liberdade de horário e local de trabalho. Exemplo destes profissionais são os freelancers, motoristas de aplicativos, prestadores de serviço para um projeto temporário e todos aqueles profissionais que oferecem sua força de trabalho de forma remota.

É um cenário relativamente novo, em que conceitos como o a Previdência Social ainda não tem uma forma adequada para recepcioná-lo. Da mesma forma acontece com a previdência privada, que ainda não possui um tipo de plano de benefícios que possa receber este tipo de trabalhador.

Em relação à forma de trabalhar com esse público, Carolina Tupinambá, entende que “tem algumas soluções e estímulos, como construir sistemas de cashback quando há renda em operação, gerar notificação do que pode gerar ganho previdenciário. Será necessário estimular isso dentro das associações de trabalhadores.”.

As transformações da natureza das relações de trabalho que percebemos atualmente já são expressivas e merecem uma atenção especial do segmento da previdência privada pois podem representar uma oportunidade de crescimento, desde que feitos os ajustes conceituais necessários. É importante flexibilizar a ideia de pagamento fixo mensal por parte do empregado e empregador, de modo a acompanhar a relação de trabalho de uma pessoa física que presta serviço para vários tomadores e que pode não ter uma renda fixa mensal.

Essas transformações possivelmente são apenas o começo de tantas outras que estão porvir, visto que as mudanças estão acontecendo cada vez mais rápido, em decorrência da influência da tecnologia. Quanto mais tempo demorar para os ajustes da previdência privada receber este público, provavelmente mais mudanças ocorrerão neste interregno de tempo, e novos ajustes podem ser necessários.

Esclarecer o conceito de previdência privada junto à população é crucial para que o setor evolua, quebrando o tabu de que a previdência privada é um produto exclusivo para as pessoas que trabalham com carteira assinada. Este esclarecimento anda com a divulgação do conhecimento sobre educação previdenciária e financeira e pode ser explorado amplamente, independente de um empregador formal

Laís Guerra é advogada e membro do Grupo de Privacidade da Previdência Usiminas. Atuante no ramo da previdência complementar (EFPC) desde 2019. Membro das Comissões de Direito Securitário e Previdência Complementar, Direito para Startup e Mediação da OAB/MG. Faz atualização em Previdência Complementar pelo ICDS desde 2023, Especialista em Mediação e Solução de Conflitos pela PUC Minas, Mestre em Direito Público pela Fumec e Pós-graduada em Direito Ambiental pela UNA.

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