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Entre algoritmos e pessoas: O novo paradigma do RH na era da IA

Fernanda Rodrigues, CHRO da GFT Technologies na América Latina
Fernanda Rodrigues, CHRO da GFT Technologies na América Latina

Confira artigo de Fernanda Rodrigues, CHRO da GFT Technologies na América Latina

A Inteligência Artificial (IA) já deixou de ser tendência para se tornar parte do cotidiano das empresas – e, no setor de tecnologia, isso é ainda mais evidente. Mas, enquanto os times de produto e engenharia se mostram mais abertos e curiosos, o RH enfrenta um paradoxo: é preciso liderar a transformação digital sem perder de vista o fator humano. E isso implica, muitas vezes, em ajudar profissionais experientes a superarem a resistência ao novo, ao mesmo tempo em que se forma uma geração de talentos que já chega ao mercado familiarizada com promptsbots e agentes inteligentes. O desafio está em equilibrar o ritmo da inovação com a responsabilidade de construir pontes para que ninguém fique para trás.

Será que estamos oferecendo os caminhos adequados para que todos possam entender e incorporar a IA ao seu dia a dia profissional? Treinamentos formais são apenas uma parte da equação. O mais difícil – e mais urgente – é inserir a IA de forma natural nos fluxos de trabalho, nos pequenos rituais da rotina, criando uma cultura em que essa tecnologia seja uma aliada constante, e não um “bicho-papão”. Porque, ao contrário do que se imagina, a IA não substitui conhecimento – ela o potencializa. E quando profissionais experientes não conseguem se integrar a essa nova lógica, a perda não é só individual: é institucional.

A cultura organizacional das empresas de tecnologia está sendo redesenhada pela presença da IA em praticamente todos os processos. Desde a criação de job descriptions que agora podem ser elaboradas e refinadas com auxílio de algoritmos até processos de recrutamento que incorporam análise automatizada de currículos, a IA está modificando a velocidade e a eficiência dos trabalhos de RH. Contudo, essa eficiência conquistada precisa ser balanceada com a necessidade de manter o elemento humano no centro das decisões estratégicas. A cultura precisa evoluir para abraçar a tecnologia sem perder a essência da gestão de pessoas.

Mais do que isso, a IA está reconfigurando o trabalho de dentro para fora. Ela impacta não apenas os processos de recrutamento ou os fluxos de onboarding, mas a própria forma como os times pensam, aprendem e se desenvolvem. É nesse cenário que surge uma responsabilidade ética e estratégica para o RH: garantir que a IA esteja a serviço da inclusão, do aprendizado contínuo e da preservação do valor humano. Não basta mais falar em capacitação, é preciso pensar em IA literacy, em redesenho de papéis, em um modelo de gestão que una estrategistas de pessoas, cientistas de dados e tecnólogos num mesmo esforço de reinvenção. Isso exige coragem institucional e compromisso com o futuro.

Na prática, essa transformação já está acontecendo. O novo modelo de gestão de pessoas que emerge desse cenário aponta para uma abordagem de hiperpersonalização sem precedentes. Softwares de performance baseados em IA permitem criar trilhas de desenvolvimento profissional adaptadas individualmente a cada colaborador, oferecendo desde planos de treinamento personalizados até sistemas de feedback instantâneo baseados em análise de dados. Esta capacidade de personalização em escala representa uma revolução na forma como desenvolvemos talentos, permitindo que cada profissional tenha uma jornada de crescimento única e otimizada. A gestão torna-se verdadeiramente data-driven, antecipando necessidades e resolvendo problemas antes mesmo que se manifestem.

Porém, há um efeito colateral importante: a dependência da IA não pode suprimir o aprendizado. Colocar tudo na IA sem entender o porquê das respostas é perigoso – pode-se criar um exército de apertadores de botão, em vez de pensadores digitais. O papel do RH, então, passa a ser o de curadoria ativa, ajudando colaboradores a interpretar, questionar e aprimorar o que os algoritmos entregam.

Ao mesmo tempo, o recrutamento também se reinventa. Hoje, boa parte das etapas de seleção já são automatizadas: triagem de currículos, análises comportamentais, testes técnicos e até o agendamento de entrevistas. Isso trouxe eficiência, mas exige vigilância. A IA deve apoiar, não substituir, a escuta humana. Sobretudo porque ainda há riscos – algoritmos enviesados, falhas de privacidade e processos impessoais que afastam candidatos valiosos. O cuidado, portanto, é dobrado: uso ético, supervisão constante e transparência com todos os envolvidos.

Aos poucos, também muda o perfil dos profissionais mais valorizados. Segundo um estudo, cargos com maior exposição à IA estão crescendo 25% mais rápido e oferecendo salários até 56% maiores. Isso não significa que todos tenham que virar engenheiros de machine learning, mas que entender a lógica dos algoritmos será cada vez mais necessário – do analista ao diretor. A boa notícia é que, com a IA assumindo tarefas operacionais, ganham destaque habilidades humanas como empatia, criatividade e colaboração. É a era da “co-inteligência”, como propõe Ethan Mollick: humanos e máquinas, juntos, fazendo o que sabem fazer de melhor.

Já há sinais claros dessa mudança. Mais de dois terços das empresas usam agentes de IA, segundo outro levantamento. E a área de RH será estratégica nesse movimento, tanto por liderar programas de requalificação quanto por ajudar a desenhar novas estruturas organizacionais mais fluídas, digitais e humanas. O trabalho não será fácil. As barreiras culturais, a ansiedade frente ao desconhecido e a falta de diretrizes claras ainda travam a adoção da IA de forma mais ampla. Mas, como mostram os dados, quem começar agora terá uma vantagem real – em inovação, produtividade e talento.

Mais do que uma tecnologia, a IA é uma virada de chave. E o RH das empresas de tecnologia tem um papel decisivo: liderar essa mudança com empatia, estratégia e visão de longo prazo. Porque a IA não é uma onda que se pode evitar – é um oceano a ser navegado. E, como toda grande travessia, ela exige preparo, bússola e coragem para conduzir pessoas por águas ainda desconhecidas.

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