As mudanças climáticas já não são uma ameaça distante: no Brasil, elas se tornaram rotina. Só na última década, municípios emitiram mais de 59 mil decretos de emergência climática, segundo levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM). A conta é bilionária: mais de R$ 400 bilhões em prejuízos desde 2013, principalmente por secas e chuvas extremas. O dado foi apresentado por Augusto Braun, assessor especial da presidência da CNM, durante o painel “Infraestrutura e Resiliência Urbana”, realizado no 3º Workshop de Seguros para Jornalistas, no Rio de Janeiro.
Braun chamou atenção para a lentidão da resposta oficial: os auxílios federais e estaduais levam em média 18 meses para chegar aos cofres municipais, quando muitas vezes uma nova catástrofe já atingiu a população. “Hoje, cada município enfrenta mais de um desastre por ano. O recurso chega quando o problema já é outro”, criticou. Ele defendeu a criação de seguros climáticos que garantam recursos imediatos às cidades, além da mobilização de consórcios municipais para dar respostas rápidas.
Infraestrutura insuficiente e dependência do setor privado
O diagnóstico sobre a vulnerabilidade urbana foi reforçado por Manoel Renato, secretário adjunto de Infraestrutura Social e Urbana do Programa de Parcerias de Investimentos (SEPPI). Ele destacou que o Brasil investe apenas 1,87% do PIB em infraestrutura, menos da metade do necessário para manter o estoque atual. “Estamos legando para nossos filhos menos infraestrutura do que recebemos”, alertou, lembrando que países como China e Índia investem entre 5% e 8% do PIB.
Renato defendeu maior participação do capital privado em projetos de saneamento, resíduos sólidos, iluminação pública e mobilidade urbana, áreas críticas para a resiliência das cidades. Ele lembrou ainda o caso recente do aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, paralisado por meses após as enchentes, como um símbolo da necessidade de novos modelos de seguro para concessões e PPPs. “Se não conseguimos investir nem na infraestrutura regular, como vamos bancar a resiliente, que é mais cara? Precisamos do setor privado ao nosso lado”, afirmou.
Investir em adaptação é mais barato do que remediar
A visão de que prevenir custa menos do que reparar foi reforçada por Karin Formigoni, diretora-geral da empresa de consultoria Arcadis Brasil e representante da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). Ela apresentou estudos que apontam que cada R$ 1 investido em adaptação pode gerar até R$ 7 em benefícios econômicos. “Quando deixamos de antecipar investimentos, o impacto de uma catástrofe pode ser dez vezes maior do que o custo da prevenção”, destacou.
Para Formigoni, a construção de cidades resilientes exige integração entre governos, setor privado e comunidades locais. Ela defendeu o uso de soluções baseadas na natureza, como sistemas de drenagem e corredores verdes, e lembrou que o Brasil já desenvolve iniciativas nesse sentido, como o manual em cooperação entre Arcadis e Ministério do Meio Ambiente, previsto para ser lançado na COP30.
O papel do seguro na transição
Moderador do painel, o diretor de Relações Institucionais da CNseg, Esteves Colnago, reforçou que a falta de planejamento urbano, somada ao déficit fiscal das prefeituras, torna urgente discutir instrumentos de seguro como apoio à reconstrução pós-desastre. Para ele, o setor pode atuar como catalisador de investimentos mais resilientes, ajudando a reduzir a vulnerabilidade das cidades brasileiras diante de eventos climáticos extremos.