Lideranças empresariais trazem 18 recomendações do Conselho Empresarial do BRICS e seis da Aliança Empresarial de Mulheres do bloco
Representantes do setor privado do BRICS entregaram uma lista com 24 recomendações de políticas públicas aos chefes de Estado dos países que integram o bloco, presidido pelo Brasil em 2025, na Cúpula do BRICS, realizada no Rio de Janeiro neste domingo (6). É a primeira vez, desde a criação do BRICS, que o setor privado apresenta recomendações objetivas.
As medidas buscam aprimorar os laços comerciais, o desenvolvimento de inovação e tecnologia, a conexão de infraestrutura, a sinergia regulatória, a transição energética e a equidade de gênero entre os países membros.
As recomendações resultam do trabalho conduzido ao longo do ano pelo Conselho Empresarial do BRICS (BRICS Business Council – BBC, na sigla em inglês) e pela Aliança Empresarial das Mulheres do BRICS (Women’s Business Alliance – WBA), ambos secretariados pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) durante o comando brasileiro do BRICS.
A construção das propostas considerou os principais desafios e as oportunidades de avanços, com a participação de mais de 1 mil representantes do setor produtivo e especialistas das 11 nações que compõem o BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China, Emirados Árabes, África do Sul, Indonésia, Etiópia, Irã, Egito e Arábia Saudita. A expectativa do Brasil é que a sistematização e padronização das recomendações contribua para o acompanhamento das entregas esperadas.
Entre as recomendações gerais, estão a criação de um programa conjunto para a recuperação de áreas degradas por meio de agricultura regenerativa; a ampliação de rotas aéreas entre os países; a aceleração do uso de energias renováveis, inclusive de oferta de combustível sustentável para aviação; o aumento de oferta de qualificação de pessoas para tecnologias verdes; e a expansão de oferta de crédito para pequenos e médios negócios.
“Sob o lema Cooperação empresarial para um futuro inclusivo e sustentável, o relatório de 2025 apresenta recomendações objetivas do setor privado que contribuem de forma concreta para fortalecer o ambiente de negócios nos nossos países”, afirma Francisco Gomes Neto, CEO da Embraer e presidente da Seção Brasileira do Conselho.
Já as recomendações para inclusão e desenvolvimento de mulheres, pelo WBA, as medidas visam a melhorar serviços e o acesso à saúde; a ampliação do crédito para empresas lideradas por mulheres; estimular a inserção de mulheres em carreiras tecnológicas e na indústria criativa.
“A WBA é uma iniciativa inédita de fortalecimento da representatividade das mulheres não apenas nos negócios, mas no desenvolvimento social e econômico do BRICS, pois avançar na inclusão e na equidade de gênero tem reflexos positivos para todos. É fundamental construir políticas transversais que apoiem a atuação das mulheres nas empresas, na economia digital e criativa e, também, que garantam acesso à saúde”, afirma Mônica Monteiro, vice-presidente Comercial e de Novos Negócios da Times Brasil, licenciado exclusivo CNBC, e presidente global do WBA durante a gestão brasileira.
Conheça os mecanismos
Criado em 2013, o Conselho Empresarial do BRICS é composto por representantes das principais entidades e empresas privadas dos países membros. Em 2025, o BBC operou sob a presidência brasileira com nove Grupos de Trabalho que cobriram setores estratégicos como Agronegócio, Aviação, Economia Digital, Energia, Finanças, Infraestrutura, Manufatura, Inovação, Comércio e Qualificação Profissional.
Já a WBA, fundada em 2019 pelos Chefes de Estado do BRICS, promove a liderança feminina e a inclusão econômica por meio de seis Grupos Temáticos que tratam de Segurança Alimentar e Ambiental, Economia Criativa, Saúde, Turismo, Economia Inclusiva e Desenvolvimento Inovador.
Confira as principais recomendações para os governos do BRICS
Recomendações do Conselho Empresarial do BRICS
Grupo de trabalho: Agronegócio
Recomendação prioritária: Estabelecer um programa dos BRICS para agricultura regenerativa e recuperação de terras degradadas.
Contexto: Segundo o Fórum Econômico Mundial, práticas regenerativas e biotecnologia têm o potencial de aumentar a produção em 40% e melhorar os resultados ambientais. Ao mesmo tempo, uma maior harmonização regulatória e melhor acesso a insumos-chave podem acelerar a integração das cadeias de valor e aumentar a competitividade global.
Grupo de trabalho: Aviação
Recomendação prioritária: Ampliar as rotas de tráfego aéreo entre os países do BRICS.
Contexto: O setor de aviação do BRICS desempenha um papel crucial na economia global, mas enfrenta desafios significativos de logística e sustentabilidade, como: 1) a ausência de voos diretos entre os Estados-membros; 2) a oferta extremamente limitada de Combustíveis Sustentáveis de Aviação (SAFs), essenciais para que o setor atinja suas metas de redução de carbono; e 3) a crescente necessidade de desenvolvimento de capital humano para os setores industrial e comercial da aviação.
Grupo de trabalho: Economia Digital e Inteligência Artificial
Recomendação prioritária: Cooperar para estabelecer confiança e governança na economia digital, promovendo parcerias público-privadas para acelerar a digitalização e a aplicação da inteligência artificial.
Contexto: Segundo a União Internacional de Telecomunicações (UIT), em 2024 cerca de 68% da população mundial utilizava a internet, e uma pesquisa recente da Soho revelou que até 50% do orçamento de TI das Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPMEs) foi destinado a serviços de computação em nuvem. Destaca-se a rápida adoção da Inteligência Artificial Generativa (IA Gen), que alcançou mais de um milhão de usuários em apenas cinco dias após seu lançamento. No entanto, a maioria dos grandes modelos de linguagem (LLMs) frequentemente falha em capturar as diferenças culturais e linguísticas existentes nos países do BRICS, razão pela qual é essencial cultivar capacidades nacionais em desenvolvimento e treinamento de IA.
Grupo de trabalho: Energia, Economia Verde e Clima
Recomendação prioritária: Acelerar a adoção de fontes de energia renovável e impulsionar a transição para energia limpa nos países do BRICS.
Contexto: Alcançar as metas de descarbonização até 2050 é fundamental para limitar o aquecimento global a menos de 1,5°C. O IPCC alerta que as emissões devem cair 43% até 2030, ou as temperaturas globais podem ultrapassar 1,5°C já em 2031. Os países do BRICS, responsáveis por aproximadamente 40% das emissões globais de GEE, devem liderar esse esforço.
Grupo de trabalho: Serviços Financeiros
Recomendação prioritária: Promover a expansão dos instrumentos de financiamento sustentável do BRICS.
Contexto: Mais de 50% das Pequenas e Médias Empresas (PMEs) nas economias do BRICS relatam acesso limitado ao crédito, com custos de empréstimos frequentemente superiores às médias globais. Enfrentar esse desafio exige não apenas ampliar o acesso ao capital, mas também reduzir seu custo por meio da inovação financeira e da diversificação do ecossistema.
Grupo de trabalho: Infraestrutura, Transporte e Logística
Recomendação prioritária: Melhorar a conectividade logística entre os países do BRICS para estimular o crescimento do comércio e o desenvolvimento econômico.
Contexto: As necessidades de investimento em infraestrutura nos países do BRICS são substanciais. O Global Infrastructure Hub estima que esses países precisarão de cerca de US$ 4,5 trilhões em investimentos em infraestrutura até 2040. O Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), com seu foco em infraestrutura e projetos de desenvolvimento sustentável, pode desempenhar um papel significativo para atender a essas necessidades. Segundo o Banco Mundial, uma logística eficiente e uma infraestrutura robusta são fatores-chave para o crescimento econômico e a competitividade. Um estudo do Banco Asiático de Desenvolvimento mostrou que a melhoria da infraestrutura de transportes por si só poderia aumentar o PIB em até 5% na região da Ásia-Pacífico.
Grupo de trabalho: Manufatura
Recomendação prioritária: Reforçar a cooperação tecnológica entre empresas do BRICS para impulsionar a inovação, acelerar a modernização da indústria e garantir o acesso equitativo a tecnologias-chave.
Contexto: A manufatura é um pilar fundamental do crescimento econômico global, respondendo por 16% do PIB global e empregando 14% da força de trabalho mundial (UNIDO). Como motor do desempenho exportador, os bens manufaturados representam cerca de 70% das exportações globais de mercadorias. O surgimento da manufatura avançada, impulsionada por robótica, IA e tecnologias limpas, está transformando indústrias e abrindo novas oportunidades de crescimento. Esse papel duplo posiciona a manufatura como um pilar central da transformação econômica.
Grupo de trabalho: Desenvolvimento de Competências e Inovação
Recomendação prioritária: Ampliar as iniciativas de requalificação profissional em tecnologias avançadas e áreas da transformação verde, a fim de apoiar a adaptação da força de trabalho às competências do futuro.
Contexto: Estima-se que 60% dos empregadores esperam que a transformação digital afete seus modelos de negócios até 2030, embora apenas 45% dos indivíduos atualmente possuam habilidades digitais básicas, segundo a União Internacional de Telecomunicações. O Fórum Econômico Mundial projeta uma mudança líquida no cenário do emprego, com cerca de 92 milhões de empregos sendo deslocados (8% do total) e 78 milhões de novas oportunidades sendo criadas (7% do total) nos próximos cinco anos. Essa transição evidencia um descompasso significativo entre as competências exigidas e as atualmente disponíveis na força de trabalho. Esforços urgentes de qualificação são necessários, com investimento proativo e colaboração entre governos, empresas e instituições de ensino para assegurar uma transição equilibrada e empregos sustentáveis.
Grupo de trabalho: Comércio e Investimentos
Recomendação prioritária: Reduzir barreiras comerciais entre os países do BRICS por meio da cooperação regulatória e da digitalização dos processos de comércio.
Contexto: Nos últimos 5 anos, barreiras prejudiciais ao comércio internacional aumentaram 500%, segundo o Global Trade Alert Database. Regulamentações divergentes e processos administrativos complexos aumentam os encargos de conformidade, limitando o ritmo da integração econômica e afetando a competitividade. O Banco Mundial estima que reduzir a burocracia alfandegária poderia aumentar a renda global em mais de seis vezes em comparação com a eliminação de todas as tarifas. Avançar em direção à cooperação regulatória e medidas de facilitação do comércio digital que simplifiquem os procedimentos aduaneiros pode aumentar a eficiência, reduzir os prazos de processamento e fortalecer a competitividade do BRICS.
Recomendações da Aliança Empresarial das Mulheres do BRICS (WBA)
Grupo temático: Indústrias Criativas
Recomendação prioritária: Adotar políticas públicas inclusivas que apoiem ativamente as mulheres nas indústrias criativas, com o objetivo de estimular a inovação, capacitar as mulheres empreendedoras, impulsionar a diversificação econômica e aumentar a competitividade geral da Indústria Criativa no âmbito do BRICS.
Contexto: De acordo com a ONU (UNCTAD), as indústrias criativas se dividem em quatro grandes grupos — Patrimônio, Artes, Mídia e Criações Funcionais. Além de impulsionar a inovação e a identidade cultural, essas indústrias geram emprego, renda e impacto social. São cada vez mais reconhecidas como motores do desenvolvimento sustentável nas economias contemporâneas. Sua força reside em combinar valor simbólico e econômico, posicionando a criatividade como ativo estratégico do século XXI. Nos países do BRICS, as mulheres estão na linha de frente da economia criativa. No entanto, barreiras estruturais persistentes relacionadas à desigualdade de gênero continuam limitando a plena participação das mulheres nesse setor. Enfrentar esses desafios por meio de políticas inclusivas e apoio direcionado é essencial para que o setor criativo se torne um espaço de equidade, diversidade e desenvolvimento duradouro.
Grupo temático: Segurança Alimentar e Segurança Ambiental
Recomendação prioritária: Implementar programas para facilitar o acesso a crédito e assistência técnica para mulheres empreendedoras rurais, garantindo apoio específico à inovação e adaptação às mudanças climáticas, fortalecendo a autonomia econômica e a proteção social.
Contexto: Com mais de 2,3 bilhões de pessoas enfrentando insegurança alimentar moderada ou severa globalmente, segundo a ONU, os países do BRICS estão em posição única para fortalecer a segurança alimentar global por meio de cadeias de suprimentos mais resilientes e diversificadas. Promover a inclusão de agricultores de pequeno e médio porte é essencial para ampliar a capacidade produtiva, reduzir vulnerabilidades e garantir acesso mais estável a alimentos em nível local e global. Apesar da capacidade do planeta em prover alimentos de qualidade para todos, um número crescente de pessoas não consegue atender suas necessidades alimentares e nutricionais. Essa situação se agravou com a intensificação das crises climáticas e ambientais, somada ao impacto da pandemia de COVID-19, que interrompeu programas de alimentação escolar, afetou cadeias de suprimento e impactou severamente os meios de subsistência de pequenos produtores, trabalhadores migrantes e sazonais e vendedores locais. Esse cenário revela um desafio sistêmico: as mulheres rurais são essenciais aos sistemas alimentares, mas continuam desproporcionalmente excluídas dos recursos e das estratégias de resiliência necessárias para prosperar diante de choques ambientais e econômicos.
Grupo temático: Saúde
Recomendação prioritária: Implementar uma estratégia coordenada entre governo e empresas para reduzir a mortalidade evitável e melhorar os resultados de saúde mental entre mulheres em situações vulneráveis, com foco na integração dos serviços essenciais de saúde da mulher nos sistemas de atenção primária à saúde.
Contexto: A saúde da mulher continua sendo um desafio crítico de saúde pública nos países do BRICS, especialmente em relação a doenças evitáveis e à saúde mental. O câncer do colo do útero ainda é uma das principais causas de morte entre mulheres em áreas com poucos recursos, apesar da existência de ferramentas eficazes de prevenção, como a vacinação contra o HPV e os exames de rotina. Segundo a OMS, sem medidas preventivas, as mortes podem aumentar de 311 mil para 400 mil até 2030. Questões de saúde mental, como ansiedade e depressão, também aumentaram, especialmente após a pandemia da COVID-19, impulsionadas por fatores como vulnerabilidade econômica e acesso desigual aos cuidados.
Grupo temático: Economia Inclusiva
Recomendação prioritária: Facilitar o acesso a mecanismos de crédito e financiamento para empresas lideradas por mulheres para aumentar a participação econômica em setores estratégicos e endossar a iniciativa de estabelecer o Fundo de Avanço de Mulheres do BRICS para oferecer linhas de crédito personalizadas e condições favoráveis para apoiar projetos de pequenas e médias empresas pertencentes ou lideradas por mulheres.
Contexto: As Pequenas e Médias Empresas (PMEs) têm papel fundamental na promoção de uma economia inclusiva, representando 99% de todos os negócios globalmente e empregando pelo menos 60% da força de trabalho na maioria dos países do BRICS, segundo dados da OIT e OCDE. Nesse cenário, os negócios liderados por mulheres surgem como motores de crescimento econômico, inovação e geração de empregos, sendo responsáveis por um terço das PMEs, conforme a Iniciativa de Financiamento para Mulheres Empreendedoras. No entanto, 70% dessas empresas enfrentam barreiras substanciais no comércio, no acesso ao crédito, na alfabetização financeira e no ingresso em redes de negócios nacionais e internacionais. Estatísticas da OIT-OCDE também revelam que a produtividade das PMEs ainda é inferior à das grandes empresas, com uma diferença média de 71% entre as economias emergentes. Além disso, cerca de 70% das PMEs ainda não estão digitalizadas devido a custos de hardware ou manutenção, escassez de talentos e habilidades digitais e dificuldades em lidar com leis e regulamentos.
Grupo temático: Desenvolvimento Inovador
Recomendação prioritária: Promover parcerias público-privadas para capacitar as mulheres em carreiras relacionadas a altas tecnologias e campos emergentes, garantindo que elas se tornem resilientes e se beneficiem plenamente do poder transformador das economias digitais e verdes.
Contexto: De acordo com o Relatório de Monitoramento da Educação Global de 2024 (UNESCO), diversas mulheres já ingressaram em carreiras STEM, com média de 35% de matrículas nos cursos de graduação. No entanto, esse percentual não mudou nos últimos 10 anos e apenas 12% das mulheres alcançam posições de liderança em profissões ligadas às STEM. As razões para isso variam entre falta de motivação e modelos femininos de referência, preconceito social e ausência de oportunidades de ascensão — o que se denomina “teto de vidro” para a progressão das mulheres em suas carreiras.
Grupo temático: Turismo
Recomendação prioritária: Empoderar mulheres e promover a resiliência e a integração do setor de turismo nos países do BRICS, aumentando a integração feminina e a liderança em novas tendências turísticas, como o turismo ambiental, de saúde, experiencial, comunitário e nômade digital.
Contexto: As mulheres representam cerca de 54% da força de trabalho global no setor de Turismo, segundo a Organização Mundial do Turismo. Fenômenos recentes, especialmente a pandemia da Covid, que reduziu os gastos com turismo em 53% em 2020, mas que se recuperaram plenamente até o final de 2023, demonstram não apenas a volatilidade, mas também a vulnerabilidade vivida por muitos atores nas cadeias de valor do setor — especialmente pelas mulheres. Com o Fórum Econômico Mundial projetando uma tendência positiva para a indústria nos próximos 10 anos, é fundamental que os países do BRICS encontrem formas de aproveitar essas novas oportunidades para promover maior equidade entre homens e mulheres no setor, enfrentando os desafios enfrentados pelas mulheres no Turismo.
O Fórum Empresarial do BRICS
O Fórum Empresarial do BRICS é uma plataforma para o avanço da cooperação diante dos desafios globais que reúne esforços dos países membros para promover uma agenda baseada em inovação, sustentabilidade e inclusão econômica. O evento conta com os patrocinadores XCMG, DP World, Keeta, WEG, Embraer, Vale, Febraban, Mebo International, Marfrig/BRF, Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), Serviço Social da Indústria (SESI) e Instituto Euvaldo Lodi (IEL), além do apoio institucional do Conselho Nacional do Sesi, da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), da Natura, do SEBRAE, da ApexBrasil e da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan).