Voto de qualidade no CARF reverte teses importantes dos contribuintes

Giovanni Faria Milet Brandão, advogado do Departamento Tributário da Andersen Ballão Advocacia / Foto: Divulgação
Giovanni Faria Milet Brandão, advogado do Departamento Tributário da Andersen Ballão Advocacia / Foto: Divulgação

Confira artigo de Giovanni Faria Milet Brandão, advogado do Departamento Tributário da Andersen Ballão Advocacia

Desde a volta do voto de qualidade, por meio da Medida Provisória (MP) 1.160/2023, e mudanças na composição das turmas do CARF, ao menos cinco teses discutidas no Tribunal tiveram alteração de entendimento em desfavor dos contribuintes.

O cenário preocupa as empresas brasileiras, que já gastam cerca de 1.500 horas de trabalho ao ano para cumprir suas obrigações tributárias e enxergavam no fim do voto de qualidade, por meio da Lei 13.988/2020, um alívio à falta de isonomia dos julgamentos administrativos federais decididos pelo critério de desempate.

Isso porque, pela sistemática do voto de qualidade, os julgamentos colegiados terminados em empate devem ser, necessariamente, desempatados por voto do Presidente do Conselho, que, por sua vez, é um representante do fisco.

Prova da disparidade nesta sistemática é o fato de que cerca de 80% dos créditos tributários, julgados por voto de qualidade, foram mantidos em favor do fisco, entre 2017 e 2020, conforme dados divulgados pelo Insper.

Todavia, com as alterações trazidas pela Lei 13.988/2020, que afastou o voto de qualidade no CARF, situações de empate passaram a ser decididas em favor dos contribuintes. Durante os três anos em que esteve ausente o voto de desempate no órgão, mudanças significativas foram observadas em matéria tributária, com a definição de precedentes importantes favoravelmente ao contribuinte – além de maior segurança jurídica às empresas no momento da adoção de práticas de compliance para adequação às normas tributárias.

Com a recente revogação do art. 19-E, da Lei 10.522/2002, pela MP 1.160/2023, e retorno do voto de qualidade, já são nítidas as mudanças de entendimento nos temas que os contribuintes haviam vencido nos últimos dois anos, como amortização de ágio interno, tributação de lucros no exterior, trava de 30% na incorporação societária, tributação de bonificação e descontos e RLR paga a diretor não empregado.

A justificativa do Ministério da Fazenda é que a retomada dessa sistemática pauta-se, sobretudo, no aumento da arrecadação fiscal – estimado em aproximadamente R$ 59 bilhões ao ano, conforme exposição de motivos da própria MP.

Abaixo, algumas considerações sobre duas dessas teses de extrema relevância aos contribuintes:

PLR paga a diretor não empregado

Um tema de impacto que voltou a ser decidido em desfavor dos contribuintes é a tributação de pagamentos a título de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) a diretores não empregados.

Durante o período em que os empates de julgamento foram decididos em favor do contribuinte, acórdãos da Câmara Superior do CARF determinaram a não incidência de contribuições previdenciárias sobre pagamentos de PLR feitos a diretores sem vínculo empregatício, tendo em vista que a Constituição Federal prevê a participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração […] como “Direito dos Trabalhadores” (art. 7º, XI).

O entendimento era inédito, considerando que a jurisprudência do CARF até então era prevalente no sentido de que apenas diretores com vínculo empregatício fariam jus à não incidência das referidas contribuições sobre pagamentos de PLR.

No entanto, com o retorno do voto de qualidade, o posicionamento pro-fisco voltou a predominar, sob o fundamento de que os diretores não fazem jus à isenção por não serem empregados para fins de aplicação do art. 2º, da Lei 10.101/2000 (processo 19515.720979/2017-11).

Amortização de Ágio Interno

A figura do ágio surge quando um ativo ou empresa é adquirido por preço superior ao seu valor patrimonial. Especificamente nas aquisições de participação societária, a legislação fiscal determina que o ágio corresponde à diferença entre o custo de aquisição da participação na investida e o valor do seu patrimônio líquido.

Historicamente, o administrativo fiscal federal possui posicionamento desfavorável aos contribuintes, com críticas aos pressupostos utilizados na amortização do ágio, falta de “propósito negocial” e utilização de “empresas-veículo”.

Apesar disso, em 2022, quando ainda estava vigente o voto de desempate pró-contribuinte, foi proferido o primeiro acórdão envolvendo a matéria em favor dos contribuintes pela 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais, do CARF (processos 16561.720001/2017-13 e 11516.721632/2012-69).

Contudo, com o retorno do voto de qualidade, por meio da MP 1.160/2023, a jurisprudência do Conselho voltou a favorecer o fisco, conforme se verifica a partir do julgamento dos processos 13005.722696/2013-53, 10600.720089/2016-94 e 16682.722573/2016-71.

Ou seja, se os julgamentos dessas teses no CARF, quando resolvidos em favor do contribuinte, já eram apertados, com o retorno do voto de qualidade ficam ainda menores as chances de êxito das empresas nas discussões citadas.

Por fim, mesmo com a volta do voto de qualidade, persiste um cenário de incertezas, considerando que a MP 1.160/2023 poderá ser alterada no Congresso Nacional, além das prováveis mudanças de composição do CARF (com o término de mandatos ao final de 2023) e o aumento de discussões judiciais já geradas pelas constantes alterações legislativas – evidenciando maior insegurança jurídica no contencioso administrativo federal.

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